Brasil: 500 anos de evangelização

 

BRASIL

500 ANOS DE EVANGELIZAÇÃO

 

 

 

APRESENTAÇÃO

 

Este trabalho de pesquisa baseou-se, na sua maior parte, no livro “História da Evangelização do Brasil — dos jesuítas aos neopentecostais”, autoria do pastor Elben M. Lenz César, que publicou esse livro quando competava 70 anos de idade. 

Jornalista e pastor, contribuiu para a fundação da Igreja Presbiteriana no Brasil  e do Centro Evangélico de Missões, sendo ainda fundador e diretor da revista Ultimato há mais de 30 anos, onde desenvolveu muitos trabalhos de pesquisa na área de religião, missiologia e história, sendo o autor das biografias dos missionários William Carey e Green Simonton.

 

INTRODUÇÃO

 

Este trabalho pretende ser um guia de pesquisa para alunos que frequentam cursos teológicos, ou para os cristãos que querem saber mais sobre suas origens religiosas.

Além de mostrar passo a passo como as intituições se formaram no Brasil, procuramos dar muita ênfase às pessoas que Deus usou nessa obra missionária, mostrando seus erros e acertos, e o que representaram para o sucesso das suas instituições.

O trabalho começa por descrever os fatos histórios do “descobrimento” do Brasil, de modo que se possa entender em que momento as coisas espirituais foram se encaixando nesse período. Embora não tenha a pretensão de ser uma obra científica, procuramos ser fiéis às fontes pesquisadas, evitando opiniões pessoais sobre os procedimentos e atitudes das pessoas envolvidas.

Uma coisa não pode ser negada: a grande maioria das pessoas mandadas para o Brasil, com o intuito de evangelizar, eram pessoas vocacionadas, destemidas, o que não quer dizer que os interesses das instituções que os enviaram eram de todo espirituais, decentes. Principalmente no primeiro período (séculos XVI, XVII e XVIII), ficou configurado um interesse maior no controle colonial do que preocupação com espiritualização do povo.

Diante das fontes pesquisadas e dos fatos históricos registrados, pode-se dividir a História da Evangelização Brasileira em três períodos distintos: o primeiro período (1500 a 1800) foi aquele em que a Igreja Católica Romana, através dos portugueses, tentou evangelizar (catequizar) a população indígena e negra que aqui estava, perseguidas pelos brancos europeus.

Já o segundo período (1800-1900), foi marcado pela chegada das missões protestantes, resultado da independência do Brasil em relação a Portugal, principalmente quanto ao protecionismo dado aos católicos.

O último período, influenciado pelos fenômenos pestecostais acontecidos nos Estados Unidos, começou em 1900 e dura até os dias atuais, passando pela neopentecostalização brasileira.


1. TRÊS SÉCULOS DE CRISTIANIZAÇÃO 


1.1  A chegada ao Brasil

 

Quando a armada portuguesa estava para partir, em 8 de março de 1500, o bispo Diogo Ortiz benzeu a bandeira da Ordem de Cristo, instituição militar e religiosa que financiou a expansão marítima portuguesa. A bordo da caravela de Pedro Alvarez Cabral viajavam o frei Dom Henrique Soares de Coimbra e 8 padres franciscanos, de modo que houvesse estrategicamente um sacerdote para cada 150 tripulantes. 

Como era costume da cultura portuguesa, suas expedições viajavam munidas do calendário litúrgico (dias dos santos), para que cada acidente geográfico encontrado fosse batizado com nomes religiosos. Assim, esses acidentes passaram a ser chamados de Monte Pascoal, Cabo de São Roque, Cabo de Santo Agostinho, Baía de Todos os Santos, Cabo de São Tomé, Ilha de São Vicente, etc.

Desembarque dos portugueses em terras brasileiras

 

1.1.1  A primeira missa

 

No dia 26 de abril, quatro dias após a chegada, Dom Henrique celebrou a primeira missa em território brasileiro, sendo que a segunda aconteceu em 1º de maio, para comemorar a paixão de Cristo. Essa comemoração foi precedida por uma procissão, da qual participaram mais de mil portugueses e cerca de 150 nativos.

A consciência missionária portuguesa incluía uma forte dose de religiosidade em “converter” para a fé católica aqueles que não a conheciam, tudo isso andando de mãos dadas com a expansão territorial, com o colonialismo e o consequente aumento do poder político. 

Charles Boxes, citado por Ronaldo Vainfas (1997) explica da seguinte forma: “A aliança estreita e indissolúvel entre a cruz e a coroa,  o trono e o altar, a fé e o império, era uma das principais preocupações aos monarcas ibéricos, ministros e missionários em geral.”  Vale lembrar aqui o que diz Isaías 1:13, quando fala que Deus não suporta a “iniqüidade  associada ao ajuntamento solene.” 

O tratamento dispensado ao índio e ao negro, o desejo de enriquecimento rápido e o concubinato, entre outros escândalos, colocam em dúvida a profundidade religiosa dos portugueses que vieram para o Brasil.

Primeira missa realizada em solo brasileiro

 

1.2  O engavetamento do projeto missionário

 

O primeiro desafio missionário em favor do Brasil tem  a  mesma  idade do país: 500 anos. A carta de Pero Vaz de Caminha (1º de maio de 1500) sugeria ao rei de Portugal que devesse cuidar da salvação do indígenas, enviando um clérigo que procedesse ao batismo deles. Ele entusiasmou-se ao ver os índios carregarem a cruz numa procissão, imitando os portugueses durante o ofício religioso, como ajoelharem-se, levantarem as mãos para o alto, etc.  Segundo Caminha, o peixe já estava na rede, faltando apenas o batismo, e os índios se tornariam “cristãos”.

A “salvação” dessa gente era defendida estusiasticamente por Caminha, iniciativa que considerava a principal semente a ser plantada na nova terra.  Ele sugeria que os indíginas poderiam ser catequisados por quatro pessoas que ficariam aqui, após a partida de retorno da expedição (dois degredados e dois desertores portugueses), enquanto não chegasse tal missionário.  A história nos mostra que essas pessoas devem ter feito muito mais do “catequizar” o povo indígena, pois 35 anos depois já havia uma pequena comunidade de mamelucos (mestiços de portugueses com índios). 

A importância desse pedido e dessa carta foi tão pequena, que nada aconteceu nos próximos anos. Esse documento, inclusive, desapareceu, só sendo encontrado e publicado quase 300 anos depois. (1827)

Só 50 anos depois desse fato é que chegou a primeira leva de missionários estáveis, a bordo da expedição de Tomé de Souza, nomeado o primeiro governador do Brasil.

 

1.3  Os escândalos religiosos na Europa

 

Esse mesmo período de espera pela chegada de missionários católicos ao Brasil (1500-1549) coincidiu com uma série de escândalos religiosos no  continente europeu, período que testemunhou 7 mudanças no troco papal, sendo que cada um deles reinou apenas cerca de 7 anos.

Quando se usa a palavra escândalo, é porque o comportamento moral desses líderes não condizia com seus cargos. O papa Alexandre VI, por exemplo, envolveu-se com uma senhora da nobreza romana, com quem teve quatro filhos. Foi esse mesmo papa quem mandou traçar a Linha de Tordesilhas, sete anos antes da “descoberta” do Brasil, separando as zonas de influência entre Portugal e Espanha.

 

1.4  A inevitável ruptura da Igreja

 

Foi nesse ambiente de profunda decadência moral e religiosa que surgiram os primeiros focos de descontentamento na Europa, visando uma reforma religiosa. (1320-1384) na Inglaterra, João Huss (1369-1415) na Tchecoslováquia, além de Jerônimo Savonarola (1452-1498) na Itália, estavam entre os primeiros. Huss e Savonarola foram mortos por ordem dos papas Alexandre V e Alexandre VI.

Porém, foi a soma de todos os esforços de reforma da Igreja, realizados na primeira metade do século XVI, que resultou na grande cisão da Igreja Cristã, envolvendo focos existentes na Inglaterra, Escócia, Países Baixos, França, Alemanha, Suíça e Prússia, através de homens como Martinho Lutero (1483-1546), Úlrico Zuínglio (1484-1531), Filipe Melâncton (1497-1560), João Calvino (1509-1564) e João Knox (1514-1572)

Se quiséssemos marcar uma data simbólica para determinar a arrancada para a Reforma Protestante, diríamos que foi 31 de outubro de 1517, quando Lutero protestou publicamente contra o abuso na venda de indulgências. Suas 95 teses foram afixadas na porta da igreja de Wittenberg, na Alemanha, durante o pontificado do papa Leão X. 

Para enfrentar os problemas da Reforma Protestante, a Igreja Católica Romana provocou a sua própria reforma (Contra-Reforma), através da ação da Sociedade de Jesus (1540), da Inquisição Romana (1542) e do Concílio de trento (1545).

Voltando às missões no Brasil, foi depois desses acontecimentos que Portugal resolveu mandar seus 6 primeiros missionários para cá (1549), membros da recém fundada Companhia de Jesus.

Nesse momento histórico, já se fazia necessário diferenciar quem eram os missionários católicos romanos  e os missionários protestantes, uma vez que em 1555 chegariam ao Rio de Janeiro os primeiros missionários reformados, não podendo se garantir se vieram com interesses de missões, ou se eram protestantes que vieram em busca de bons negócios aqui. 

É bom que se diga que, no início desse mesmo milênio, já havia acontecido uma primeira separação da Igreja Romana, quando foi fundada a Igreja Católica Apostólica Ortodoxa, também chamada de Igreja Oriental.

Abaixo, alguns dos maiores líderes da Reforma Protestante.

 

2. O INÍCIO DA EVANGELIZAÇÃO

 

2.1  Os primeiros missionários católicos

 

Como já foi dito, os primeiros missionários a chegarem aqui pertenciam à Companhia de Jesus, fundada pelo sacerdote basco Inácio de Loyola, cujos membros faziam voto de pobreza.  Sua ação espelhava-se no comportamento de Jesus, procurando buscar e salvar o que se havia perdido. Para isso, fundaram uma casa de recuperação para prostitutas, uma hospedaria para agasalhar moças solteiras, nobres empobrecidos e meninos abandonados. Loyola costuma dizer: “Devo orar como se tudo dependesse de Deus e trabalhar como se tudo dependesse de mim.”  Quando morreu em 1556, ele mantinha cerca de mil jesuítas em vários continentes.

Junto com Tomé de Souza, primeiro Governador Geral do Brasil, vieram mais de mil pessoas entre soldados, funcionários, colonos, artesãos e cerca de 400 criminosos condenados a viver fora de Portugal. Foi nessa mesma viagem que chegaram os seis primeiros missionários ao Brasil (1549), subordinados a Loyola, e tendo como chefe imediato Manoel da Nóbrega. 

Depois de instalar o primeiro colégio jesuíta na Bahia, Nóbrega foi para a capitania de São Vicente, onde fundou o Colégio de São Paulo (1554). Com sua morte, vieram outros jesuítas, podendo-se destacar os nomes de José de Anchieta (1534-1597) e Antônio Vieira (1608-1697). Durante 200 anos, o número de jesuítas chegou a 480, sendo que pouco menos da metade já eram pessoas nascidas no Brasil.

 

2.2  As primeiras dificuldades

 

Quanto à opção de evangelizar o território brasileiro, surgiram, de imediato, dificuldades a serem enfrentadas, que enumeraremos a seguir:

 

Extensão territorial e migrações

 

A extensão territorial (cem vezes maior que Portugal) foi a principal dificuldade encontrada pelos primeiros missionários, além das diferentes migrações a se estabelecerem aqui, como os europeus (portugueses, franceses, holandeses,etc.) e africanos (escravos).

 

A diversidade cultural indígena

 

Os primeiros missionários foram descobrindo que havia povos indígenas de diferentes línguas e costumes. Eles habitavam todo o litoral, além do interior próximo e distante, representando cerca de 1,5 milhão de habitantes, divididos em mais de mil etnias. Entre muitas outras, podem ser citados os aimorés, apinajés, botocudos, caertés, caiapós, canelas, cariris, goitacazes, guaianazes, guaranis, tabajaras, timbiras, tupinambás, tupiniquins, tupis, xerentes e muitos outros.  Eram mais de mil etnias indígenas, cada uma com suas características e línguas distintas. Até hoje há equipes de missionários gastando em torno de 25 anos de suas vidas para traduzir o Novo Testamento para determinadas línguas indígenas.

Quanto à religiosidade indígena a ser substituída pela fé católico-romana, registre-se que os índios não tinham deuses certos, nem ídolos, mas eram religiosos, dançavam, cantavam, submetendo-se a seus pajés (sacerdotes, profetas e médicos-feiticeiros). De um modo geral, nenhum desses povos sabia da unicidade de Deus, da Sua santidade, soberania, amor e graça. Nunca ouviram falar de Jesus, Seus milagres, Sua morte e ressurreição, Sua ascenção e volta.

Esses indíginas não tinham residência fixa, mudando de lugar de acordo com as conveniências de abundância ou escassez de comida. Em cada oca moravam várias famílias, constando de pai, mãe, filhos, genros e noras, mulheres solteiras, parentes idosos, amigos, agregados, netos, bistenos e até prisioneiros de guerra.  O contato íntimo entre os casais acontecia fora da oca, no mato ou na praia. Eles não tinham horário pré-estabelecido para alimentação e nem costumavam ajuntar comida em celeiros. 

Além disso tudo, os indígenas se dividiam em pacíficos, guerreiros e até antropófagos, e suas comunidades eram separadas umas das outras por grandes distâncias. A população indígena da época era superior a toda a população de Portugal.

Aos leitores que gostariam de se aprofundar nessa lamentável forma de evangelização imposta por aqui, sugerimos que procurem por um filme chamado "A Missão", que ainda existe por aí, e que mostra todas as atrocidades cometidas contra os índios da região sul, principalmente no Brasil e países vizinhos como Paraguai, Argentina, etc. 

 

Colonização com baixo padrão moral

 

Quanto à colonização, os homens brancos que haviam fixado residência no Brasil, com rara exceção, eram pessoas de baixo padrão moral, degredados, desterrados ou desertores. Outros eram aventureiros ávidos de enriquecimento rápido. Mas todos eram católicos batizados e “cristãos”. Importante: eles vinham para cá sem suas esposas e filhos. 

Segundo Gilberto Freyre, citado por Celso Masson Fernandes (1997), o colonizador português chegou ao Brasil à procura de um ambiente propício para liberar a sua sexualidade, tornando-se responsável pela forte sexualização da cultura brasileira que esite até hoje.  Euclides da Cunha, citado por Carl Hah (1989), disse o seguinte: “A mancebia com as caboclas descambou logo em franca devassidão, de que nem o clero se isentava.”  

Quanto a uma possível nova formação étnica, as pessoas que vieram a nascer aqui eram todas mamelucos (filhos de pai branco e mão índia). Quanto aos africanos, vale registrar que o deus africano Xangô era louvado por suas proezas sexuais (tinha 400 mulheres) e a deusa Oxum era considerada uma espécie de símbolo do desejo.

Outro problema a ser enfrentado era a dificuldade natural de conviver com respeito e castidade diante nudez das belas índias brasileiras. Eduardo Bueno (1998) menciona, em seu livro, Anchieta comentando que elas andavam nuas e não sabiam negar-se a ninguém, sendo que elas mesmas asseciavam os homens, metendo-se com eles nas redes, considerando uma honra dormir com os cristãos. 

Por outro lado, essa nudez indígena era considerada como uma atitude pura, uma ausência de pecado. Alguns viajantes da época chegaram a dizer que aquela terra seria como um éden ainda não violado. Cristóvão Colombo, ao descobrir a América (1492), comentou em suas cartas que havia atingido o paraíso bíblico.

 

A população negra

 

Onze anos antes da chegada dos primeiros jesuítas, o Brasil já podia ser considerado um país de evangelização complicada, pois além das várias centenas de etnias indígenas, começavam a chegar levas e mais levas de escravos africanos. Segundo registros de José de Anchieta, em 1585 já havia 14 mil negros no território brasileiro, numa população de 24.800 brancos, sendo que o início do século XVII assistiu ao empate entre as duas populações. No final do século XVII, o número de negros e mestiços já chegava a 1,5 milhão contra uma população branca de 1 milhão. 

Alaôr Scisínio (1997) garante que ao fim da escravatura havia registro de um total de 8 milhões de africanos trazidos à força para o Brasil, oriundos de quase todos os recantos da África. Calcula-se que havia representantes de mais de 250 etnias, falando um número enorme de línguas e dialetos.

Esses escravos eram caçados no seu próprio território, vendidos a traficantes e embarcados para o Brasil. Cada navio trazia, em média, 500 a 700 negros, entre homens, mulheres e crianças, acumulados nos porões das embarcações. Muitos morreram durante a viagem por falta de ventilação, higiene e alimentação básica. Acredita-se que no século XVI as perdas nas viagens chegaram a representar 25% das pessoas trazidas. Outra afirmação fortíssima é que 400 mil negros não completaram sua viagem ao Brasil. Eles eram lançados ao mar, à medida em que morriam. Vale lembrar que um navio negreiro levava de 35 a 50 dias na viagem entre a África e o Brasil. Dependendo de condições climáticas e distâncias, a travessia podia durar até 6 meses. 

Chegando aqui eles eram batizados com nomes em português, mas tendo como sobrenome a sua procedência: Antônio Angola, José Cobu, Maria Moçambique, etc. Após um período de “engorda”, eles eram separados estrategicamente de seus familiares e amigos, misturados depois aleatoriamente, de modo a dificultar a comunicação entre eles e evitar uma possível rebelião. Só depois disso é que eram postos à venda para fazendeiros brasileiros.

Eles eram avaliados como animais: olhava-se a língua, os olhos, eram apalpados... O preço variava de acordo com a robustez, a idade e o sexo. Para que se tenha idéia do valor de compra desses escravos, 20 escravos bem escolhidos valiam tanto quanto um cavalo. Uma vez comprados, eles poderiam ser doados, vendidos, alugados, leiloados ou trocados. 

Os escravos mais robustos eram utilizados para engravidar as negras mais férteis, de modo a multiplicar-se estrategicamente o número de trabalhadores para o futuro. Sua única paga eram a comida (três vezes ao dia) e a roupa básica.  Eles dormiam sobre esteiras e qualquer desobediência era castigada com acorrentamentos e sucessivas chicotadas. Aquele que tentasse fugir, era marcado com ferro quente, de modo que ficasse escrito no seu corpo a letra F de fujão. A vida útil de um escravo em trabalhos era 15 anos.

As escravas eram utilizadas para satisfazer os desejos sexuais dos homens brancos solteiros, enquanto eles aguardavam casamento. 

Não poucos provocaram suicídio, na viagem e também aqui no Brasil. Também acontecia com eles uma doença chamada “banzo”, uma espécie de depressão, sofrimento de saudade da sua terra e de seus parentes. Isso os levava a um tipo de loucura e até à morte. Segundo o padre Vieira, eles tinham o corpo na América e a alma na África.

Quanto à parte missionária, a Igreja parecia não enxergar esses sofrimentos, nem movia um dedo para que isso acabasse. Além de ter sido o último país a extinguir o comércio e a utilização de mão-de-obra escrava, o Brasil foi a nação que importou o maior número de escravos, cerca de 40% daqueles que vieram para toda a América.

 

A violência generalizada

 

Muitos perigos assolavam às pessoas que iam chegando à terra. Em 1556, por exemplo, os índios caetés dizimaram todos os viajantes de um navio naufragado, e em 1570 piratas invadiram dois navios que traziam, entre outras pessoas, 43 jesuítas. Os que não foram mortos à espada, foram jogados ao mar. No meio ambiente, além dos animais selvagens e da incontável quantidade de insetos, o calor e as doenças tropicais eram outro problema para esses europeus despreparados. 

Um fato que também merece registro são as injustiças cometidas pelos europeus contra os negros e os indíginas, calçados no seu sentimento de superioridade étnica, e no seu poder econômico e militar. Muitas atos de barbárie foram cometidos aqui, principalmente na época do colonialismo, quando índios eram caçados, escravizados ou exterminados. Os negros africanos eram colocados “em engorda” depois da chegada, separados de seus familiares. Recebiam apenas a comida, a roupa e castigos, numa escravidão vergonhosa que durou 350 anos (1538-1888). 

Encerrando, apesar da motivação errada que os missionários católicos tiveram nos três primeiros séculos de evangelização, eles conseguiram transplantar aqui a cultura cristã. Como resultado, vemos ainda hoje que, salvo raríssimas exceções, todos os brasileiros são cristãos, embora a maioria esmagadora seja formada por cristãos nominais, aqueles que vivem sem uma vida religiosa, sem doutrina e sem salvação. E isso é reconhecido por todos, até mesmo pelos católicos romanos. 

 

2.3  Os primeiros missionários protestantes

 

Exatamente seis anos após a chegada dos primeiros missionários católicos ao Brasil, aportou na Baía de Guanabara uma caravana ecumênica proveniente da França, composta de artesãos, soldados e agricultores (alguns católicos, outros protestantes), sob o comando do navegador e aventureiro Nicolau Durant de Villegaignon, pessoa onde se misturava uma fé católica com protestante. Eram, ao todo, três navios, somando aproximadamente 600 pessoas, entre tripulantes e passageiros. 

Nessa época, os protestantes franceses (huguenotes) não tinham segurança no seu país, e pensaram em construir aqui a França Antártica, com duas motivações: econômicas e religiosas.  Como esse povo era composto de católicos e protestantes, vislumbrou-se a possibilidade de uma nova terra onde se tivesse liberdade de culto, o que não acontecia nas grandes metrópoles. 

Um ano depois chegou a segunda leva de colonos franceses (300 pessoas), católicos e sem religião, em sua maioria. Junto deles, vieram 14 huguenotes (reformados de língua francesa) de Genebra, mandados por João Calvino, o líder suíço da Reforma Protestante. Entre essas 14 pessoas estavam o doutor em teologia Pierre Richier, o pastor Guillaume e o historiador Jean de Léry, que mais tarde editaria excelentes trabalhos na Europa, discorrendo sobre as coisas do Brasil.

 

2.3.1  O primeiro culto

 

No dia 10 de março de 1557 realizou-se o primeiro culto reformado abaixo da linha do Equador, tendo como local o Forte Coligny. Na ilha, hoje chamada de Villegaignon, Richier pregou em francês sobre o Salmo 27:4.

No dia 23 de março, fundou-se a primeira Igreja evangélica brasileira e da América do Sul. Registre-se, que entre a primeira missa e o primeiro culto evangélico houve um tempo de 57 anos. 

Nicolau Durant de Villegaignon, depois de parecer ter aceito a fé evangélica, expulsou os genebrinos da ilha, que foram morar num local hoje conhecido como Olaria, no continente.  Três meses depois foram obrigados a voltar para a Europa, não suportando a perseguição daquele homem. 

No dia 9 de fevereiro de 1558 Villegaignon mandou estrangular e lançar ao mar quatro autores de uma confissão de fé reformada, sendo que apenas um deles conseguiu escapar. Os outros três se tornaram os primeiros mártires evangélicos do continente: Jean de Bourdel, Matthieu Verneuil e Pierre Bourdon.  Essa confissão de fé constava de 17 artigos que definiam assuntos como a Ceia, a mediação única de Jesus como advogado e intercessor, único acesso possível ao Pai, que justifica aos que crêem pelo Seu sangue, provocando a vitória sobre a morte. 

Segundo Álvaro Reis em seu livro (1917), os demais huguenotes começaram a fugir para o interior do país, sendo que muitos deles foram sendo mortos por ordem de governantes, como Men de Sá, tudo isso na presença do padre José de Anchieta.  

Em janeiro de 1567 Villegaignon foi expulso do Brasil, com seus companheiros, através de ordem do próprio governador Mem de Sá.

Registre-se que Jean de Lévy (companheiro mandado por Calvino) escreveu e publicou uma obra intitulada “Narrativa de uma viagem feita a terra do Brasil, também chamada América”, que foi traduzida imediatamente para o latim, holandês e alemão, sendo muito consultada até os dias de hoje.

Abaixo, uma pintura da Ilha de Villegaignon, podendo ver-se na paisagem as características marcantes da Baía da Guanabara, Morro do Pão de Açúcar, etc.

 

3. UMA DISTORÇÃO DOUTRINÁRIA DE 300 ANOS


3.1 Anchieta: um cristianismo sem ressurreição

 

Anchieta pode ser considerado o maior nome da evangelização do Brasil, chegando aqui em 1553, aos 19 anos. Pela sua obra missionária, chega a ser chamado de “O apóstolo do Brasil”. Para sentir-se o andar da História, vale registrar que ele tinha 12 anos quando Lutero morreu. Escreveu o livro “Gramática da língua mais usada na costa do Brasil”, além do catecismo “Diálogo da fé”, em duas línguas: português e tupi, sete anos depois da sua chegada ao Brasil.

Quanto ao “Diálogo da fé”, constava de 616 perguntas e respostas, propositalmente endereçadas ao esclarecimento dos problemas culturais brasileiros, com relação aos ensinos bíblicos. Trata ali de temas como antropofagia, suicídio, feitiçaria para matar pessoas, adultério, falso testemunho, etc. 

Praticamente 1/4 do catecismo trata dos acontecimentos da sexta-feira santa. No início, Anchieta explica que Jesus morreu por Sua própria vontade, para tornar possível o perdão de Deus para todos os homens. Depois explica os acontecimentos do sofrimento de Jesus, desde a prisão até a morte de cruz, inclusive registrando a conversão de um dos ladrões na cruz, e os fenômenos ali ocorridos.  

Quanto ao lado negativo, em nenhum momento Anchieta fala sobre o rompimento do véu no templo, ou sobre a ressurreição de Cristo, Suas aparições nos 40 dias que se seguiram, e a Sua ascenção aos céus. A história simplesmente termina no túmulo, local que a própria Bíblia afirma que ficou vazio.  Aí podemos fazer uma citação de 1ª Coríntios 15:14 que diz o seguinte: “Se Cristo não ressusticou, é vã a nossa pregação, e vã a vossa fé.”

O registro final do catecismo vem a quebrar toda uma série de verdades bíblicas, quando diz que Maria cobriu a nudez do corpo de Jesus, fato que não se acha relatado em nenhum dos quatro evangelhos ou em outra parte da Bíblia. Também coloca Maria e os santos como intercessores, o celibato obrigatório, uso de imagens, indulgências, limbo, purgatório, etc.

Foram essas as verdades guardadas no coração e na memória dos negros, dos indígenas e dos europeus que “devoravam” esse catecismo, e talvez tenha sido esse o motivo da preferência, que até hoje se vê na maioria dos brasileiros, pela morte de Jesus em detrimento de Sua ressurreição. Basta observar as comemorações pascais da Igreja Católica Romana: eles comemoram muito mais a morte de Jesus na sexta-feira do que a Sua ressurreição no domingo.  

Por outro lado, o catecismo explica bem claramente as duas naturezas de Jesus (homem e Deus) e a existência da Trindade (Deus é um só mas não é uma pessoa só)

 

3.2 A fé cristã se mistura à fé pagã


3.2.1  A fé cristã

 

Com algumas exceções, a presença da Igreja Católica Romana nos três primeiros séculos da História do Brasil foi um desastre. Segundo registros históricos católico-romanos, o fato da Igreja Romana dominar sozinha o panorama religioso, não a forçava a enxergar e a corrigir os seus erros.  

O primeiro grande erro foi a demora em mandar missionários para trabalhar com os 1,5 milhão de indígenas da época, e padres para pastorear os brancos portugueses aqui residentes. Roma estava assustada demais com o surgimento da Reforma Protestante na Europa para se preocupar com os indígenas de uma nova terra descoberta. Além disso, as autoridades portuguesas estavam muito mais interessadas nas Índias. Por isso afirmamos que foram cinqüenta anos jogados fora.

Como já foi dito anteriormente, nessa virada de século (1500) era dramática a situação do clero. Não havia vocação, não havia preparo e não havia moral. O padre tinha se transformado num funcionário eclesiástico, sem preocupações com evangelizações ou conversões. Aqui no Brasil, pelo fato de não poder casar (celibato), os sacerdores se juntavam a escravas. 

Sintetizando essa idéia, não era padre o que faltava aqui, mas santidade nos que aqui estavam. O próprio padre Manoel de Nóbrega, citado por Hoornaert (1992), escreveu certa vez: “Cá há clérigos, mas é a escória que de lá vem.”  Ele estava se referindo a Portugal, é claro. 

Assim, o casamento da evangelização como a colonização resultou numa catástrofe. Eram duas coisas bem diferentes, mas uma tomou carona na outra, fato que aconteceu em várias partes do mundo, não só no Brasil. Veja o que Manoel da Nóbrega escreveu ao rei de Portugal em 1558, segundo José Maria de Paiva (1982), referindo-se às vantagens de investir da evangelização no Brasil: “Nosso Senhor ganhará muitas almas e Vossa Alteza muita renda nesta terra.” Conclui-se, então, pelas palavras de Nóbrega, que para a nobreza portuguesa, evangelizar era sinônimo de aportuguesar.

Se nos reportarmos ao batismo bíblico praticado por João Batista na época de Jesus, quando os pecadores arrependido o procuravam para serem batizados, o que se viu aqui foi um procedimento completamente antagônico: os jesuítas é que iam atrás dos batizandos, nas aldeias indígenas, portos de desembarque de escravos, nas senzalas... Eram batizados à força.  Enquanto João batista restringia o batismo ao arrependimento, os sacerdotes portugueses o aplicavam a qualquer pessoa, em qualquer situação. Basta dizer que nos primeiros oito anos de trabalhos os missionários já haviam batizado 15 mil índios. De uma só vez, foram batizados 3.700 indígenas. 

É bom que se diga também que tais batismos representavam segurança para os negros constantemente ameaçados, pois era uma espécie de salvo-conduto para serem melhor tratados na nova realidade que estavam vivendo. Quem conhece bem a Palavra de Deus, deve estar pensando que não havia festa no céu, quando esses homens se batizavam por atacado, apesar de serem batizados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.  Mas, por outro lado, havia muita alegria na Corte de Portugal, pois esses homens parariam de causar problemas para os brancos. Stephen (1964) diz que esses batismos em massa em outros continentes traziam recompensas aos batizadores: recebiam por cabeça. 

Esses três primeiros séculos de evangelização portuguesa foi um tempo sem livros, sem universidades, com censura à leitura de livros religiosos, principalmente a Bíblia, que era exclusividade dos padres.  Segundo o historiador católico Eduardo Hoornaert (1992), “Um cristianismo sem livros se torna em pouco tempo uma religião sem fundamentação bíblica, divorciada da teologia, uma prática de devoções e cerimônias sem ligação com a vida.”

 

3.2.2   A fé pagã

 

Havia uma guerra de culturas — a européia, a indígena e a africana. Todos saíram perdendo nessa guerra.  Como uma cultura não conseguia se impor à outra, o que se viu como resultado foi uma mistura das três que, originalmente, já eram resultados de uma mistura maior ainda. É a essa situação que se dá o nome de sincretismo cultural e religioso.

Assim, a Igreja  não conseguiu manter separadas as crenças indígenas e africanas de um lado e a fé cristã de outro. Era mais cômodo que elas se unissem, e gerassem um cristianismo diferenciado do cristianismo original. 

Esse foi o legado deixado para o século XIX: um criatianismo deformado, nominal e superficial, sem coerência e autoridade, baseado mais em festas e comemorações do que em compromissos com Deus. Até hoje nosso país continua colhendo os frutos amargos dessa plantação.

 

 

4. CHEGAM OS PROTESTANTES E A BÍBLIA


4.1  Igreja Reformada Holandesa

 

Agora, veremos como aconteceu a chegada das Igrejas reformadas ao Brasil, cada uma a seu tempo, dando ênfase às pessoas que se destacaram nas iniciativas evangelizadoras e a implantação das Igrejas.

Existem registros de que no dia 20 de setembro de 1634 aconteceu o batismo de uma criança brasileira chamada Domingos Fernandes Filho, numa igreja protestante do Recife, solenidade que contou com a presença de holandeses, alemães, poloneses, portugueses e brasileiros. É um fato curioso, pois as igrejas reformadas só chegariam ao Brasil em 1817. 

O que aconteceu é que essa Igreja instalou-se por ocasião da invasão holandesa no Nordeste, com propósitos missionários junto aos indígenas daquela região. Todo o processo, do começo ao fim,  teve a mesma duração da invasão holandesa: 25 anos.  Vale registrar que o Conde João Maurício de Nassau-Siegen era membro e freqüentador  assíduo da Igreja Reformada. 

 

Características 

 

O Nordeste, nessa época, era chamado de Brasil Holandês, e essa Igreja dava muita importância à fé e à conduta dos fiéis, reflexo da Reforma Protestante acontecida cem anos antes. Seu movimento aqui no Brasil recebeu o nome de “Puritanismo Holandês”, tendo a Bíblia como norma de fé e comportamento. Defendiam o bom tratamento aos escravos, conservação do meio ambiente, observação do domingo, os dez mandamentos da lei de Deus, dar liberdade aos culto não-protestantes, etc.

Para atingir seus objetivos, a Igreja Reformada Holandesa contava com 54 pastores-pregadores 120 presbíteros, 120 diáconos, etc. Os pregadores funcionavam ao mesmo tempo como capelães militares, pastores das igrejas e missionários entre os indígenas. A Ceia do Senhor acontecia apenas quatro vezes ao ano.

Em 1642, um desses pastores, David Doreslaer, escreveu um catecismo em três línguas (tupi, holandês e português), com o título “Uma instrução simples e breve da Palavra de Deus nas línguas brasiliana, holandesa e portuguesa” . 

 

4.2  Os protestantes demoram a chegar

 

Em  1805,  aportou  na  Bahia,  por  duas  semanas,  um  navio  inglês  a caminho da Índia. Entre os passageiros estava um ministro chamado Henry Martyn, que iria desempenhar a função de missionário no continente asiático.

Assim que desembarcou, Martyn procurou conversar com pessoas importantes e alguns sacerdotes católicos, com quem falava em latim e francês. Ele ficou impressionado com a grande quantidade de cruzes em Salvador. Segundo Duncan Reily (1984), Martyn registrou no seu diário: “Aqui há cruzes em abundância, mas quando será levantada a doutrina da cruz?” 

Henry Martyn

Lembramos que, até esse ponto, todo o trabalho de evangelização fora feito exclusivamente por missionários e padres católicos, com exceção de pequenas infiltrações, como dos huguenotes franceses em 1557-1558 (ocupação francesa) e dos holandeses no Nordeste em 1630-1654 (ocupação holandesa). 

Como apenas passou por aqui, a participação de Martyn para o desenvolvimento da evangelização do Brasil se reduziu a seus escritos, seus livros, onde criticou veementemente a falta de uma evangelização efetiva, bíblica, aos moradores dessa nova terra. Enquanto os missionários católicos demoraram 49 anos para atender aos apelos de Caminha, os missionários protestantes demoraram 50 anos para atender aos apelos de Martyn. 

O primeiro motivo dessa demora dos missionários protestantes estava no fato das igrejas protestantes européias e norte-americanas ainda não possuírem nenhuma visão missionária. Parece que a ordem do “Ide!” foi específica para os apóstolos da Igreja Primitiva, e não para eles. 

Em 1792 William Carey escreveu um livro que mudaria essa visão comodista das Igrejas reformadas: “Investigação sobre a obrigação dos cristãos de empregar meios para a conversão dos pagãos”. Foi a partir daí que sociedades missionárias passaram a ser organizadas, mandando missionários para o mundo inteiro.

Como segundo motivo para essa demora, pode-se citar a falta de liberdade religiosa no Brasil, cujo território era dominado por Portugal, um dos países mais católicos do mundo daquela época. Além disso, havia uma preferência pela Ásia e África, onde a evangelização era zero, imaginando-se não ser bom competir com o trabalho católico mantido na América Latina.

Desde a época de Lutero, já eram editados livros de Américo Vespúcio sobre o Mundo Novo, suas características, sua gente, livros que tiveram uma vendagem enorme.  Só naquela época, seu primeiro livro vendeu mais de 10 mil exemplares, sendo traduzido para o alemão, francês, italiano, holandês, espanhol e tcheco. 

Em 1557, foi lançado um livro chamado  “Descrição  verdadeira  de  um país de selvagens”, escrito pelo alemão Hans Staden, que estivera aqui por duas vezes. Esse livro teve mais de 50 edições em alemão, flamengo, holandês, latim, francês e inglês. Sua versão para o português só aconteceu em 1892, com o nome de “Duas viagens ao Brasil”, e transformou-se num dos documentos mais preciosos e confiáveis da etnografia brasileira. 

Em 1578, o pastor calvinista francês Jean de Léry, ex-missionário no Brasil, publicou o livro “Narrativa de uma viagem feita à terra do Brasil, também chamada América”, que logo foi traduzido para o alemão, latim e holandês.  O livro descrevia os fatos acontecidos na ilha de Villegaignon, os indígenas, a flora, a fauna e outras coisas singulares da terra brasileira.

Porém, o livro que efetivamente provocou grandes vocações missionárias para o Brasil foi “Reminiscências de viagens e permanências nas províncias do sul do Brasil” (1840), escrito pelo missionário metodista Daniel Parish Kidder.  Foi através da curiosidade provocada por esse livro que vieram novos missionários para o Brasil. Entre eles podem ser citados o missionário escocês Robert Kalley, chegando ao Rio de Janeiro em 1855, e o missionário norte-americano Zacarias Taylor, para a Bahia em 1882. Kalley foi o pioneiro dos congregacionais no solo brasileiro, enquanto que Taylor transformou-se num dos dois precursores da Igreja Batista.

Para as pessoas interessadas, avisamos que os livros de Hans Staden, Jean de Léry e Daniel Kidder podem ser encontrados no Brasil através da Editora da Universidade de São Paulo.

 

4.3 A Bíblia Almeida chega ao Brasil

 

O português João Ferreira de Almeida foi morar ,ainda jovem, nos Países Baixos e de lá foi para a Indonésia, onde aceitou o Evangelho. Dotado de grande capacidade lingüística, ele aos 16 anos traduziu o Novo Testamento parta o português, baseado em versões latinas, espanholas, francesas e italianas. Mais tarde, enquanto trabalhava como missionário no Sri Lanca e na Índia, passou a traduzir o Antigo Testamento a partir dos originais hebraicos e gregos. Sua morte (1691) impediu o término desse último trabalho, tarefa que foi assumida por Jacobus Akker.

A princípio, a versão portuguesa da Bíblia destinava-se aos falantes de língua portuguesa no sudeste asiático, mas em 1809 ela passou a ser imprimida pela Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira, de modo a suprir a necessidade dos refugiados portugueses na Inglaterra. Só depois é que essa versão passou a ser mandada para Portugal e Brasil.

Em 1914 os exemplares da Bíblia completa em português começaram a ser distribuídos nos navios para pessoas que se dirigiam ao Brasil, mas a partir de 1918 a distribuição começou a ser comercial, através de agentes das duas sociedade bíblicas: a Britânica e a Americana. 

O primeiro deles foi o pastor batista escocês James Thompson (1781-1854), que encarregou-se de iniciar a distribuição da Bíblia em toda a América Latina. Apesar de não se saber se ele chegou a estar no Brasil, tem-se notícias de que em 1820 ele mandou para cá 100 Bíblias completas e 200 Novos Testamentos.

Por outro lado, o missionário metodista americano Daniel Parish Kidder (1815-1891) foi o primeiro correspondente da Sociedade Bíblica Americana a se instalar no Brasil, sabendo-se que percorreu o país de norte a sul, tentando de forma destemida fazer a Bíblia conhecida entre os leigos.

A partir de 1850 apareceu uma versão católica para o português, feita pelo padre Antônio Pereira de Figueiredo. O que a diferenciava da obra de Almeida é que foi traduzida diretamente da Vulgata, e incluía os livros apócrifos. Seu trabalho durou 18 anos. 

Foi a partir de 1855 que passou-se a ter um trabalho missionário não interrompido no Brasil, ou seja, 40 anos depois da chegada da Bíblia Almeida. Enquanto a Igreja Católica Romana não estimulava a leitura da Bíblia, os protestantes, ao contrário, ensinavam que cada fiel deveria ter a sua própria Bíblia, estudar seu conteúdo, na certeza de que ela é a única regra de fé. 

Em 1856, depois da chegada dos pioneiros Robert Kalley (Igreja Congregacional) e Ashbel Green Simonton (Igreja Presbiteriana), a Sociedade Bíblica Britânica resolveu abrir um depósito permanente de venda de Bíblias, no Rio de Janeiro.

Para encerrar, é bom dizer que a Bíblia Almeida, depois de várias e sucessivas revisões, aínda é a Bíblia preferida pelos evangélicos de língua portuguesa.

 

4.4 Os imigrantes alemães

 

Os primeiros 300 colonos alemães chegaram ao Brasil em 1824, sendo que quase metade deles eram protestantes luteranos. Apesar de alguns terem ficado em Nova Friburgo/RJ, a grande maioria estabeleceu-se no Rio Grande do Sul. Segundo registros, a permissão estatal para a vinda dos alemães tinha como objetivo “branquear” a população, pois a quantidade de negros, mulatos e mamelucos era três vezes maior do que a dos brancos. 

Em 1845 veio a segunda leva de alemães imigrantes para o Brasil, quando chegaram 1.800 colonos, espalhando-se a maior parte pelo Rio Grande do Sul, Santa Catarina, e alguns no Rio, Minas e Espírito Santo.

Os alemães chegaram aqui com sua fé luterana, mas em nenhum momento com interesses de evangelização, missões, etc., fato que pôde ser constatado no despreparo dos ministros instituídos para dirigir os trabalhos religiosos das igrejas edificadas. Esses dirigentes viviam de forma imoral, não recomendada nem a um chefe de família, quanto mais a um líder espiritual. 

Só a partir de 1864, com a chegada do pastor Hermann Borchad, é que a escolha dos pastores passou a merecer uma maior atenção, como formação teológica, fazendo com que a comunidade luterana de São Leopoldo/RS se tornasse referência para todo o luteranismo brasileiro. 

Em 1900, o Brasil já possuía uma população de 18 milhões de pessoas, sendo que do total 600 mil eram alemães ou descendentes, e desses, a metade composta de protestantes. (em torno de 350 mil) 

 

4.5  Missionários de língua inglesa

 

Tratando-se especificamente da evangelização e missões, na segunda metade do século XIX predominou a chegada de missionários protestantes da Inglaterra e principalmente dos Estados Unidos, fora alguns casos de pastores protestantes que vieram para cuidar de igrejas já existentes.

A enorme e contínua movimentação missionária aconteceu a partir do ano de 1855, com os congregacionais, os presbiterianos, os metodistas, os batistas, e terminando em 1889 com os episcopais.

Esses missionários, ao contrário do que aconteceu com os alemães luteranos, tinham boa cultura teológica, eram vocacionados para a obra, apaixonados por Jesus. Eram homens e mulheres piedosos, pessoas de oração, de testemunho impecável, e dispostos a qualquer sacrifício em favor do Evangelho e dos fiéis conquistados. Muitos deles exerciam funções paralelas, como a Medicina, Agronomia, Literatura. 

Esses missionários fundaram igrejas, escolas, seminários, institutos bíblicos, universidades, clínicas, hospitais, jornais e editoras, colocando a Bíblia literalmente na mão do povo. Através do seu trabalho impecável, eles tiveram moral para exigir da Igreja Católica Romana o reconhecimento e o respeito pela diversidade religiosa.

Na parte realmente espiritual, apresentaram a salvação pela graça, mediante a fé, mas sempre mostrando que a fé sem obras é morta. Como resultado do seu trabalho, mudaram o rumo de vivência de muitas famílias, que iam abandonando a mentira, o furto, a ira, a vingança, a prostituição, o álcool, a malandragem, o analfabetismo e outros males, tudo por causa do temor do Senhor. E seus filhos iam sendo educados nessa mesma direção. Estava sendo realizado missões com propósitos de conversão a Jesus.

Se os evangélicos hoje são um povo que canta bastante, muito se deve a esses missionários do século XIX, a começar pelo casal escocês Robert Reid Kalley e Sarah, que organizaram a primeira e maior coletânia de cânticos em língua portuguesa, que recebeu o nome de “Salmos e hinos”. Dessa coletânia faziam parte hinos de Martinho Lutero, John Wesley, Fanny Crosby, da cantora Sankey, entre outros. Havia 618 hinos, nessa coletânia. Os missionários ensinavam os protestantes a cantar em quatro vozes, surgindo daí grandes corais nas Igrejas locais.

Menos de 80 anos depois de ser criada a Escola Dominical na Inglaterra, por Robert Raikes (1735-1811), o casal Kalley implantou a idéia na cidade de Petrópolis/RJ, em 1855, idéia que passou a ser seguida por quase todas as Igrejas Evangélicas do país.

Embora não existam dados claros sobre a  quantidade  de  missionários enviados para o Brasil na segunda metade do século XIX, estima-se que foram centenas. Quanto ao sexo, se pegarmos como exemplo a Igreja Presbiteriana com sede no sul dos Estados Unidos, a maioria dos seus missionários que vieram para cá eram mulheres (solteiras e casadas). 

 

 

 5.  AS IGREJAS TRADICIONAIS

 

5.1  Igreja Luterana

O Brasil só deixou mesmo de ser 100% católico a partir da sua independência de Portugal. Tanto é assim que dois anos depois (1824) chegaram os primeiros 300 imigrantes alemães, metade deles protestantes luteranos, seguindo para o Rio Grande do Sul e Nova Friburgo. No meio deles veio o pastor Friedrich Oswald Sauerbronn, considerado o primeiro ministro protestante residente no país. No mesmo ano chegaram mais dois pastores para São Leopoldo/RS, Johann Georg Eschenburg e Carl Leopold Voges. Em seis anos, já havia mais de 2.500 almas aqui.

Calcula-se que a quantidade total de imigrantes alemães, durante o século XIX, tenha chegado a 300 mil pessoas, incluindo Rio Grande, Santa Catarina, Rio de Janeiro, e em menor escala em Minas e Espírito Santo.

Apesar da aparente liberdade de culto no país, a Constituição de 1824 dizia que a Igreja Católica Apostólica Romana continuaria a ser a religião do império, sendo que aos outros segmentos religioso só seria permitido as reuniões em residências, sem que exibissem qualquer aparência de templo, ou seja, sem torres, sinos, cruzes, etc. 

Como a imigração alemã não tinha como principal motivo a evangelização, as pessoas colocadas à frente desses trabalhos deixavam muito a desejar, eram despreparadas, tanto na vida familiar como no púlpito. Quanto a Eschenburg, por exemplo, sua saída foi exigida pelos colonos do Rio Grande, pois ele não vivia moralmente o que pregava nos púlpitos. Voges, que o substituiu, não era muito diferente: fabricava e vendia cachaça, mantinha escravos aos seus serviços, ocupando-se mais com os negócios do que com a paróquia. Enquanto os padres batizavam os 

negros com nomes em português, Voges os batizava com sobrenomes em alemão: Adelina Schmitt, etc.  Sintetizando, Voges pregava, batizava, casava e enterrava suas ovelhas, mas não as “alimentava”. Os cultos resumiam-se a leitura de sermões prontos e orações impressas. Quando o grupo se cansava, ele pulava algumas páginas.

Outros personagens que vale mencionar foram o pregador Johann Friedrich Schrader, que era alcoólatra, e que misteriosamente foi achado morto no campo, além de Philipp Andreas Weber, Erdmann Wolfram e K.Strüker que também eram dados à bebida alcoólica. Segundo o escritor Carlos Hunsche (1983) o pastor Heinrich Theodor Recke (Campo Bom/RS) teve que fugir para Buenos Aires, após ter cometido um “delito vergonhoso”.

Esses registros acima, e um relatório mandado para a Alemanha em 1866,  escrito pelo pastor Wilhelm Kleingünther, narram a situação cristã irreal que viviam os imigrantes alemães até essa época. Cultos rápidos e depois grandes farras nas vendas e botecos, batizando crianças com a água de despejo onde se lavava copos de cachaça e assim por diante. Era a coisa mais comum um líder “espiritual” trocar a Bíblia por um sabre e tornar-se um soldado, um fazendeiro, carroceiro, etc. 

A partir de 1864, com a chegada do pastor Hermann Borchad, a escolha dos pastores passou a merecer um crivo maior, como a exigência de uma formação teológica, trabalho que transformou a cidade de São Leopoldo no ponto de referência do Luteranismo brasileiro. 

A mesma vergonha que os imigrantes protestantes tinham dos seus pastores no Sul, era a mesma que os imigrantes católicos tinham de seus padres de lá, pois também costumavam viver escandalosamente. Porém, com a chegada de jesuítas alemães em 1850, mudanças também começaram a acontecer no meio dos imigrantes católicos.

Quando se chegava ao ano de 1900, o Brasil já contava com uma população total de 18 milhões de pessoas, sendo que 600 mil delas eram alemães ou descendentes, metade protestantes (em torno de 350 mil), número que superava a soma dos congregacionais, presbiterianos, metodistas, episcopais, batistas e adventistas juntos.

          

 

5.2  Igreja Metodista 

O trabalho missionário dessa instituição foi muito elogiado e respeitado no seu início, tanto pela Igreja Católica Romana do Brasil, quanto pelo presidente norte-americano Abraham Lincoln.  Era a maior denominação protestante de lá, em razão do seu fervor e métodos evangelísticos. 

A primeira pessoa enviada para cá foi o pastor Fountain Elliot, em 1835, que veio para pesquisar o novo campo missionário. Os dois primeiros missionários enviados, para iniciar os trabalhos, foram R.Justos Spauding (1836) e Daniel Parish Kidder (1837). O segundo, foi o grande distribuidor de Bíblias em quase todas as províncias brasileiras. Já Spauding deixou instalada uma congregação de 40 membros. 

Motivado por problemas políticos internos dos EUA, os trabalhos missionários no Brasil foram interrompidos por 25 anos, só recomeçando em 1867, época em que os congregacionais e os presbiterianos já estavam aqui instalados. O missionário Junius Newman foi um dos homens que começaram essa segunda parte dos trabalhos no solo brasileiro, desenvolvendo uma atividade muito próximo às cidades paulistas de Piracicaba e Campinas 

Depois veio John (1876), que casou com a filha de Newman. Ele era vítima de críticas por jornais católicos, chegando a trabalhar até nas redondezas de Juiz de Fora/MG, onde em seguida foi fundado o famoso Instituto Granbery, em honra a John C.Granbery, o primeiro bispo da Igreja Metodista americana. Esse colégio, anos depois, viria a se tornar um estabelecimento de ensino superior, escola de profetas, e o primeiro seminário metodista no Brasil. Antes de ir embora (1886),  Ranson fundou o jornal “Expositor Cristão”, considerado até hoje o órgão oficial da Igreja Metodista do Brasil. Ranson era considerado um pregador de qualidades inigualáveis. 

Nessa mesma época já estava na região de Belém do Pará o missionário Justus H.Nelson, que lá permaneceu por 45 longos anos. 

Em 1881 chegou ao Brasil James William Koger. Dentre suas proezas, pode-se destacar a construção em São Paulo (1885) do primeiro templo com a aparência externa proibida pelas autoridades imperiais, exibindo uma cruz e uma torre com sino, prerrogativas que só os católicos tinham até a proclamação da República.  

Com a morte de Koger, veio para cá o missionário John S. Mattison, que também morreu de febre amarela um ano depois, doença que viria a matar a outros pastores e missionários no final do século XIX, como  John William Tarboux, o primeiro bispo metodista residente no Brasil.

       

 

5.3  Igreja Congregacional

 

O médico escocês Robert Reid Kalley foi o pioneiro do trabalho missionário protestante na Ilha da Madeira (1838) e o primeiro missionário a estabelecer um trabalho sistemático nas terras brasileiras, através da Igreja Congregacional. Seu nome é estranhamente esquecido em obras de peso sobre a evangelização do novo mundo.  Por outro lado, o escritor e pregador Andrew Bonar refere-se a Kalley como o maior nome das missões modernas, segundo o livro escrito por MichaelTesta (1963).

Pertencentes a famílias abastadas da Escócia, Kalley e sua esposa alugaram a casa do embaixador americano em Petrópolis, com duas camareiras alemãs, um jardineiro português, privilégios incomuns para missionários. Mas foi graças ao seu nível intelectual, cultural e econômico que ele conseguiu alcançar a elite brasileira com o Evangelho. Para que se tenha idéia do seu prestígio na alta sociedasde, em 1859 ele batizou duas damas da Corte Imperial, mantinha amizade estreita de visitas com D.Pedro II.

Porém, apesar da sua estreita convivência com os nobres, Kalley conseguia se relacionar muito bem com os pobres, dando-lhes assistência médica e espiritual, ao mesmo tempo.

 

Robert Reid Kalley

 

Kalley nasceu em 1809 em Mount Florida, arredores de Glasgow, capital escocesa. Aos seis anos já era órfão de pai e de mãe, sendo criado pelo segundo marido de sua mãe e pela nova esposa dele. Em 1836 ofereceu seus serviços à Junta Missionária da Igreja da Escócia, para ser médico missionário na China. Como não deu certo sua ida à China, em 1838 ele seguiu como missionário para a Ilha da Madeira, onde sofreu violenta perseguição do clero católico português. Como ficou preso por dois anos e meio, sob ameaças de morte, fugiu da prisão e voltou à Inglaterra, onde se prepararia para outra empreitada. 

Em 1855 chegou ao Brasil, onde permaneceu por 21 anos, até 1876. Três anos após sua chegada ele já tinha organizado a primeira igreja (1858), quando fez o primeiro batismo. Dez anos depois, para não haver confusão com o nome da Congregação Presbiteriana fundada por Ashbel Simonton, mudou o nome de sua própria Igreja para Igreja Evangélica Fluminense, nome que utiliza até os dias atuais.

Para facilitar o desenvolvimento do seu trabalho, Kalley trouxe para cá um grupo de discípulos da Ilha da Madeira, que o ajudaram muito na comercialização de Bíblias.

Na área da música, deve-se ao casal Kalley a publicação do primeiro hinário  brasileiro, chamado “Salmos e Hinos”, publicado em 1861, inciando com 18 salmos e 32 hinos, chegando hoje a um total de 608 hinos, sendo que 72 deles são de autoria de sua esposa Sarah Kalley e 13 do próprio Robert Kalley. 

 

5.4   Igreja Batista

A Igreja Batista foi a quarta denominação a chegar ao Brasil, demora essa creditada às desencontradas informações dadas por seus espias que aqui estiveram antes para sondar o campo. 

Em 1860, um desses espias (Thomas Jefferson Bowen) solicitou sua inclusão entre os primeiros missionários a serem mandados para o Brasil, chegando aqui apenas seis meses depois dos presbiterianos e quatro anos depois do pioneiro congregacional Kalley.  Seus relatórios não devem ter sido bons, a respeito do Brasil, pois a Igreja Batista afastou-se durante 20 anos do nosso território. 

Por causa da derrota do exército confederado na guerra civil americana, um de seus heróis (General Hawthorne) foi obrigado a sair do país, direcionando-se para o Brasil, onde organizou uma colônia de imigrantes americanos, tudo com o apoio pessoal do Imperador Pedro II, com quem Hawthorne mantinha um relacionamento pessoal de amizade.

Só depois que o General Hawthorne fez um relatório empolgado sobre as perspectivas de um grande trabalho missionário do Brasil, é que a Igreja Batista voltou a direcionar seus olhos para cá. Foi por sua influência que os dois primeiros missionários batistas vieram para o campo reaberto: Zachary Clay Taylor e William Buck Bagby.

Em 1882, as famílias Taylor e Bagby foram para Salvador, um campo bem mais necessitado de novos missionários. Junto com eles também se deslocou a família do ex-sacerdote católico brasileiro Antônio Teixeira de Albuquerque, morando todos, por algum tempo, numa só casa de três quartos, onde logo fundaram a Primeira Igreja Batista no Brasil. 

Diante das dificuldades em aumentar a freqüência, os missionários resolveram encher os bolsos de Novos Testamentos e ganharem as ruas, visitando lojas e armazéns, locais onde pudessem encontrar algumas pessoas juntas para ouvirem o que tinham para dizer. Praticaram o que se chama atualmente de evangelismo pessoal.

Dois anos depois (1884), William Bagby e família voltaram para o Rio de Janeiro, que já possuía meio milhão de habitantes, de onde se deslocavam para o interior das províncias de Minas Gerais e do próprio Rio de Janeiro. No ano 1900 Bagby viajou para São Paulo, onde permaneceu por 27 anos, local em que sua esposa fundou o hoje conhecido Colégio Batista Brasileiro. (1902). Em 1927 a família Bagby transferiu-se-se para Porto Alegre, onde William morreu onze anos depois, sempre pregando o evangelho.

Quanto a Taylor, permaneceu em Salvador, onde fundou o primeiro jornal batista “O eco da verdade” (1886), nome que foi mudado duas vezes.

Com todo esse trabalho iniciado em várias frentes, o ministério batista começou a crescer mais do que as outras denominações, inclusive a presbiteriana. 

 

O batismo por imersão

 

Até a chegada dos primeiros missionários protestantes (1866), o batismo no Brasil, tanto católico como protestante (luteranos, congregacionais e presbiterianos), era realizado por aspersão (água aspergida sobre a cabeça).

Com a instalação de uma igreja batista na colônia americana nas proximidades de Campinas/SP (1871) começou a ser aplicado do Brasil o batismo por imersão (o batizando mergulha na água), caracterizando e diferenciando logo essa Igreja das demais, da mesma forma como a guarda do sábado destaca os adventistas. Para se ter idéia do impacto que causou, alguns pastores de outras denominações resolveram se submeter a esse novo batismo, vindo a tornar-se batistas, a partir daí.

Dois anos depois, o missionário Zachary Clay Taylor publicou o livro “A Bíblia sobre o batismo”. Em 1908, esse mesmo missionário foi para a cidade do Porto, em Portugal, onde rebatizou quinze membros da Igreja Batista daquela cidade, numa contundente constatação sobre a irregularidade dos batismos realizados até aquela data (aspersão). 

 

5.5  Igreja Presbiteriana

Em 1859 a população mundial já era de um bilhão de pessoas, sendo que os Estados Unidos tinham 30 milhões e o Brasil 10 milhões. Foi um ano atípico no mundo todo, repleto de muitos acontecimentos, épca em que foram lançados três livros que mudariam a cabeça de muitas pessoas: ”A origem das espécies” (Charles Darwin), “Crítica da política econômica” (Karl Marx) e “O que é o espiritismo” (Allan Kardec). 

Foi nesse mesmo ano que desembarcou no Rio de Janeiro o  primeiro missionário presbiteriano  (Ashbel G. Simonton), um jovem solteiro de 26 anos, recém-formado em seminário. Seu trabalho no Brasil durou apenas 7 anos, mas deixou muitas raízes. 

Junto com Alexander Latimer Blackford, o segundo missionário presbiteriano a chegar aqui, edificaram a hoje chamada Catedral Presbiteriana do Rio de Janeiro, o primeiro presbitério, a primeira escola paroquial e o primeiro seminário. Eles ordenaram o primeiro pastor brasileiro, o ex-padre José Manuel da Conceição (1865), que no interior de São Paulo era conhecido como o “Padre Protestante”. Os três juntos fundaram um jornal  puramente evangelístico, chamado “Imprensa Evangélica, que circulou durante os 25 últimos anos do Império e durante os três primeiros anos da  República. Esse jornal muito defendeu reformas legais que dessem liberdade de culto, sendo remetido regularmente às autoridades e a padres selecionados e leitores atentos e diferenciados.

 

José Manuel da Conceição (ex-padre)

 

O trabalho de Conceição é considerado importantíssimo até hoje, quando o Evangelho se espalhou por várias dezenas de cidades paulistas, mineiras e cariocas. Em Brotas/SP, foi edificada o que considerou-se, por muito tempo, a maior igreja evangélica brasileira. Como formação, Conceição havia estudado Aritmética, gramática, história sagrada, além de desenho e pintura com um pintor francês em Sorocaba. Como não existia um seminário organizado, ele passou a estudar filosofia, retórica, francês e teologia em vários lugares. Foi ordenado padre em 1844.

Ele tinha muita convivência com algumas famílias presbiteriana alemãs em Sorocaba, ensinando-lhes português enquanto eles lhe ensinavam o alemão. Ele admirava muito o costume deles de ler a Bíblia, reunirem-se aos domingos para cultuar a Deus, o fato de não serem dados a botequins, nem bebedeiras. Com o tempo ele foi mostrando interesse pelos estudos bíblicos, que ia aplicando nas paróquias onde era designado. Ele pregava a Bíblia como a Palavra de Deus, não dando muita importância às imagens e às confissões auriculares. Por esse motivo, ele era transferido sistematicamente, de modo a não contaminar as paróquias com suas idéias. Por esse motivo, ele era conhecido como “o padre protestante”.

Diante das pressões cada vez maiores da Igreja Católica Romana, Conceição começou a se sentir amordaçado, não podendo defender um cristianismo mais bíblico, mas cristocêntrico, mas puro e transformador. A princípio, achava possível travar uma luta interna no catolicismo romano, uma reforma dentro da sua Igreja, para tentar impor seu ardor evangelístico.

Diante das infrutíferas tentativas, em 1863 ele solicitou sua saída das funções sacerdotais, e no mesmo ano teve um encontro com o missionário presbiteriano Blackford, quando uma conversa produtiva e cuidadosa girou em torno da obra redentora de Jesus. Folhetos evangélicos e exemplares da Bíblia foram deixados na mesa de Conceição, material que ele distribuiu voluntariamente na população de Brotas/SP. 

No ano seguinte ele visitou a Igreja Presbiteriana no Rio de Janeiro, onde foi convidado a pregar a Palavra de Deus, oportunidade em que professou sua fé em Jesus Cristo, sem mais reservas. No início de 1865 ele foi ordenado ao ministério, passando a ser um dos cinco ministros presbiterianos em terras brasileiras.

Se trabalho passou a ser itinerante, visitando suas antigas paróquias, procurando rever os ensinos anteriores e apresentando a nova mensagem. Ao todo, foram 32 cidades paulistas que ele manteve em visitas, além de cinco cariocas e três mineiras. Durante essas viagens aconteceu de ser agredido, sendo apedrejado, chicoteado e recebendo pauladas. 

Conceição gostava de abria clareiras, deixando a organização da nova igreja para outros missionários que o seguiam. De “padre protestante”, passou a ser chamado de “padre louco”. 

Conceição nunca se casou. Morreu em 1873, num hospital militar no Rio de Janeiro, depois de ser encontrado desmaiado na rua. Seu corpo foi enterrado como indigente, mas depois de identificado, foi transladado e enterrado ao lado de Ashbel Simonton, no Cemitério dos Protestantes, muito próximo do atual Hospital das Clínicas, em São Paulo.

 

5.6  Igreja Episcopal

Em 1889 chegaram ao porto de Santos James W.Morris e Lucien Lee Kinsolving, os dois missionários pioneiros da Igreja Episcopal do Brasil. Como eles eram recém-formados de um seminário teológico da Virgínia, Estados Unidos, e diante da sua disposição de virem para o Brasil, eles foram imediatamente ordenados para o diaconato e dois meses depois ao presbiterato. Sua chegada quase coincidiu com a proclamação da República, que  desoficializou a Igreja Católica Romana, dando aparente liberdade de culto para todos os credos religiosos.

Seu interesse em virem para o Brasil nasceu de visitas que faziam à casa de uma senhora presbiteriana, na Virgínia, com quem morava Helen Murdoch Simonton, nascida no Brasil e filha única e herdeira dos pertences de Asbel Green Simonton, o pioneiro da Igreja Presbiteriana no Brasil.

Por sugestão de missionários presbiterianos, os dois passaram meio ano em Cruzeiro/SP, onde aprenderam o português, direcionando-se depois para Porto Alegre/RS, onde foram recebidos por dois presbiterianos que, mais tarde, tornaram ministros episcopais. Kinsolving, inclusive,  tornou-se o primeiro bispo episcopal em território brasileiro.

O motivo para os episcopais crescerem tão depressa em solo brasileiro, foi a pouca quantidade de padres católicos para atender às populações residentes no Rio Grande do Sul. Com oito anos de atividade ali, a Igreja Episcolal já contava com  301 membros e 4 pastores brasileiros.Em 1903 foi fundado um seminário teológico, contando com 8 alunos e 4 professores. 

Kinsolving deu 33 anos de sua vida ao trabalho missionário.

 

6. AS IGREJAS PENTECOSTAIS

 

6.1  O avivamento da rua Azuza

 

O começo do século XX trouxe grandes novidades para o mundo evangélico, através de uma série de acontecimentos nos Estados Unidos. Um grupo de alunos de um  instituto bíblico em Topeka, começaram a ter experiências pentecostais, acontecendo o batismo do Espírito Santo semelhantemente ao que houve no dia de Pentecostes, com a Igreja Primitiva. 

A Enciclopédia Wikipédia define Pentecostalismo como reunião de grupos religiosos cristãos, originários do seio protestante, baseando-se na crença da presença do Espírito Santo na vida dos crentes através de sinais, denominados como dons do Espírito Santo, tais como falar em línguas estranhas (glossolalia), interpretação das mesmas, curas, milagres, visões etc.

Em 1906, em Los Angeles, um negro chamado  William J. Seymour (1870-1922) foi convidado a pregar, e o sucesso foi tal que resolveram alugar um galpão na rua Azuza. Foi nesse local que teve início a “Missão da Fé Apostólica”, com reuniões avivadas, rompendo com toda e qualquer organização vista até então nas igrejas evangélicas tradicionais.

Como Los Angeles era a cidade que mais estava crescendo na Califórnia e em todos os Estados Unidos, esse movimento pentecostal teve uma repercussão por todo o país e até no exterior.

Nascia ali, naquele galpão, o chamado Século Pentecostal, um movimento muito mais visível do que qualquer outro que aparecera até então. Pastores de outras denominações americanas e do resto do mundo chegavam à rua Azuza para conhecer o movimento, sendo que a maioria recebia também o batismo com o Espírito Santo, e aderia imediatamente. Um desses líderes foi o norte-americano Young C. H. Mason, da “Igreja de Deus em Cristo”, composta predominantemente de negros, que até hoje é considerada a maior denominação pentecostal dos Estados Unidos.

Pessoas que participaram do início desse movimento encarregaram-se de levar as novidades para outras cidades norte-americanas e outras partes do mundo, incluindo-se aí o Brasil.

Existem hoje um número interminável de instituições ou denominações pentecostais, só no Brasil. Vejamos os nomes de algumas delas: Católicos Carismáticos, Congregação Cristã do Brasil, Comunidade Evangélica, Igreja Batista Nacional, Igreja Betânia, Igreja Betesda, Igreja Crist~ça Evangélica, Igreja Cristã Maranata, Igreja Cristã Pentecostal no Brasil, Igreja de Deus Avivamento Bíblico, Igreja do Evangelho Quadrangular, Igreja do Nazareno, Igreja Evangélica Ágape, Igreja Evangélica Assembléia de Deus, Igreja Evangélica do Avivamento Bíblico, Igreja Evangélica Avivamento do Deus Vivo, Igreja Evangélica Chamas do Avivamento Bíblico, Igreja Evangélica Cristo Ressurreto, Igreja Evangélica Embaixadores de Cristo, Igreja Evangélica Missionária Pentecostal, Igreja Evangélica Povo de Deus, Igreja Internacional da Graça de Deus, Igreja Metodista Wesleyana, Igreja Missionária Arca da Nova Aliança, Igreja Pentecostal Novas da Alegria, Igreja Pentecostal Deus é Amor, Igreja Pentecostal Independente, Igreja Pentecostal de Jesus Cristo, Igreja Pentecostal da Nova Vida, Igreja Pentecostal O Brasil para Cristo, Igreja Pentecostal o Som da Palavra, Igreja Pentecostal Unida do Brasil, Igreja Presbiteriana Renovada do Brasil, Igreja da Restauração, Igreja Tabernáculo Evagélico de Jesus, Casa da Bênção de Deus e Igreja Universal do Reino de Deus. 

Além dessas, ainda podem ser citadas outras ramificações como Adventista da Reforma, Adventista da Promessa, Metodista Ortodoxa, Igreja da Restauração, Congregacional Independente, Cristã Evangélica Renovada, Sinais e Prodígios, Maranata, Socorristas, Salão da Fé,  Evangélica da Renovação, Jesus é a Verdade, Cristo Vive, Cristã Antioquia, Cristo Rei, Assembléia de Cristo, Batista Independente, Templo da Bênção,...  Desses, a maioria surgiu entre 1960 e 1990, sendo que a maioria delas nasceu no Brasil.

Templo da Rua Azuza, em Los Angeles (1906)

 

6.2 Congregação Cristã do Brasil

 Havia em Chicago um italiano  chamado Louis Francescon, que foi um dos fundadores da Primeira Igreja Presbiteriana Italiana daquela cidade. Com a chegada do avivamento de Los Angeles a Chicago, a primeira pessoa a receber o batismo no Espírito Santo foi a esposa de Francescon, ele próprio um mês depois, e uma sucessão espantosa de pessoas na seqüência. 

 

Francescon e o Brasil

 

Em 1909, Francescon abandona seu emprego, guiado por Deus, e viaja para a Argentina e no ano seguinte para o Brasil, onde teve contato com a imensa colônia italiana residente em São Paulo. Ao freqüentar a Igreja Presbiteriana do bairro do Braz, ele provocou um cisma na comunidade, enquanto falava sobre o ministério do Espírito Santo.

Logo, cansado dessas perseguições, juntamente com alguns dissidentes presbiterianos, batistas, metodistas e católicos, fundou a Congregação Cristã do Brasil, que não parou de crescer até os dias atuais.

Ao contrário de outros pioneiros, Francescon nunca teve moradia permanente no Brasil, fazendo uma ponte permanente entre Estados e Brasil, durante anos. 

 

Característica da entidade

 

Apesar da mesma origem da Assembléia de Deus (ria Azuza), a Congregação Cristã tem um procedimento totalmente diferente, é intolerante e sectarista, com fortes tendências de ser considerada uma seita. Sua direção e membros consideram-se a única denominação no caminho certo, não apresentando nenhum interesse em relacionar-se com outras denominações, mesmo as pentecostais. Também não costumam publicar jornais, revistas de estudo bíblico ou livros, não se utiliza de rádio, televisão e não promovem reuniões em locais públicos. 

A evangelização da Igreja é pessoal, e seus cultos geralmente são longos. As pessoas, que aderem suas idéias, são consideradas predestinadas e chamadas por Deus para a Salvação. Não há ministros ordenados, nem burocracia eclesiástica. O pregador é suscitado na hora do culto, por “revelação de Deus”. Os anciãos não são assalariados e dirigem a parte espiritual da instituição. A Ceia é realizada apenas uma vez por ano. 

Outro fato interessante é que não mantém um rol de membros, sendo que o único registro nesse campo é o número de pessoas batizadas, o que a princípio era em italiano e em português.

Embora esteja presente em todos os estados brasileiros, a C.C.B. é mais forte na região Sudeste, onde encontram-se 47% dos seus templos, principalmente no estado de São Paulo. O crescimento sempre é maior nas cidades interioranas do que na capital (80% dos templos). 

Apesar de ser extremamente soberba, por se considerar “A obra do Senhor” e não “Uma das expressões da obra do Senhor”, a Congregação é a denominação brasileira mais discreta quanto à sua liderança eclesiástica, pois só os anciãos e diáconos são considerados obreiros.

No tocante a dinheiro, seus freqüentadores não podem contribuir com cheques, para que seus nomes não apareçam.  Pelo fato de seus obreiros não serem assalariados, todo o dinheiro arrecadado é aplicado na construção de novos templos, os quais obedecem a um único padrão arquitetônico.

Uma última característica que diferencia a C.C.B. das outras denominações pentecostais é que a distribuição de hinários à irmandade é três vezes maior do que a de Bíblias, deixando dúvidas quanto à motivação da institução. 

 

6.3 Assembléia de Deus

Os suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg também fizeram parte daquelas pessoas que receberam o sopro do Espírito Santo em Los Angeles e Chicago. No verão de 1910, foi-lhes entregue uma profecia sobre uma missão transcultural para um lugar chamnado Pará, um local de clima muito diferente, e a viagem deveria acontecer no dia 5 de novembro daquele mesmo ano. Só depois de pesquisarem numa biblioteca, é que descobriram que aquele era o nome de um estado brasileiro e não de um país.

Eles viajaram para Belém do Pará em 1910 onde, ao chegarem, iniciaram um trabalho missionário que se transformaria mais tarde na criação da Assembléia de Deus. 

 

Vingren e Berg

 

Esses dois homens nasceram num momento difícil da história da Suécia. Entre os anos 1867 e 1886 mais de meio milhão de suecos tiveram que deixar o seu país por causa da escacez de comida e de trabalho, sendo que a maioria imigrou para o meio-oeste americano. Primeiro foi Daniel Berg e um ano depois foi Gunnar Vingren, com 20 anos de idade.

Os dois vieram a se conhecer em 1909, numa igreja de Chicago, cidade em que vivera Dwight Moody, até sua morte, dez anos antes. Gunnar já tinha se formado em Teologia num seminário batista na Suécia, e pastoreava uma Igreja no estado de Michigan, enquanto que Daniel trabalhava numa quitanda da cidade de Chicago. 

Durante uma conferência na Igreja Batista Sueca de Chicago, Gunnar recebeu o batismo no Espírito Santo, vindo a falar em línguas estranhas, fato que o motivou a pregar a doutrina pentecostal dali em diante. Como metade da igreja que pastoreava rejeitou suas idéias, ele passou a pastorear outra Igreja batista sueca em outro estado, transformando-a em igreja pentecostal.

Um dos seus seguidores, nessa igreja, um outro sueco chamado Adolf Ulldin, foi o encarregado de lhe anunciar o que ouvira da parte de Deus a respeito do ministério além-mar. Quando Daniel foi visitar Gunnar, recebeu a mesma profecia.

Obedientes a essa orientação,  no dia 5 de novembro eles embarcaram em Nova York para o Pará, sendo que compraram passagens de terceira classe, por motivo da falta de recursos. Quando desembarcaram, duas semanas depois em Belém, estavam com 90 dólares no bolso, não sabiam uma só palavra em português e não havia ninguém esperando por eles. 

Foi assim que começou a obra da Assembléia de Deus no Brasil, sem planejamento, sem projeto, sem reuniões presbiteriais, ou de juntas missionárias, etc.  Era só o mover do Espírito quem movia aqueles homens.

Nessa época, as denominações protestantes tradicionais já estavam com seus trabalhos missionários em bom andamento no solo brasileiro, na região Sudeste (congregacionais, presbiterianos, metodistas e salvacionistas), na região Sul (luteranos e episcopais) e na Bahia (batistas).  A Assembéia de Deus, entretanto, iniciou seus passos pelas terras pobres da região Norte, um clima realmente muito diferente da Suécia. Um eterno verão quente e úmido.

Assim que chegaram, os dois missionários foram acolhidos por Raimundo Nobre, o coordenador de uma missão batista em Belém, permitindo-lhes participação nos cultos. Mas eles vieram a provocar uma divisão na igreja quando pregavam sobre o batismo com o Espírito Santo, o falar em línguas, promovendo reuniões de oração com esse fim, etc. Aborrecido com o comportamento dos dois, Raimundo Nobre remeteu correspondência a todas as Igrejas existentes no país, denunciando-os.

Enquanto Daniel, cinco anos mais jovem, tinha muita saúde e resistência física, Gunnar era mais preparado intelectualmente, tornando-se, naturalmente, o líder do trabalho.  Daniel era um ganhador incomum de almas, um excelente vendedor de Bíblias e grande evangelizador pessoal, indo de casa em casa, de ilha em ilha, de enfermaria em enfermaria. Além da mala cheia de Bíblias, ele ainda carregava o seu violão, cantando belos hinos em português e em sueco. Já Gunnar, era o grande pregador, ia batizando, organizando a obra, criando novos pontos de pregação e congregações. Morreu 30 anos antes de Daniel. 

Da mesma forma como o missionários protestantes foram  beneficiados pelo trabalho anterior dos jesuítas, Gunnar e Berg foram beneficiados pelo trabalho dos missionário evangélicos tradicionais (1855-1910), intensificando a pentecostalização das igrejas já existentes. Porém, o grosso da membresia das Assembléias de Deus vinha das trevas da ignorância religiosa e das trevas do pecado e da incredulidade. Os dois, junto com os pastores brasileiros ordenados por eles, não pregavam apenas a Jesus, mas a salvação que havia n’Ele, o batismo com o Espírito Santo e a mensagem completa do Evangelho.

Gunnar Vingren e Daniel Berg

 

A implantação das igrejas

 

A primeira igreja pentecostal foi organizada em 18/11/1911, seis meses depois da chegada da dupla ao Brasil, recebendo o nome de “Missão da Fé Apostólica”, em homenagem ao nome dado ao trabalho realizado no galpão da Rua Azuza, cinco anos antes em Los Angeles. Só em 1918 é que o nome “Assembléia de Deus” foi adotado. 

Nenhuma denominação evangélica no Brasil experimentou um crescimento tão rápido e tão grande como o das Assembléias de Deus. Nos quatro primeiros anos (1911-1914) houve 384 batismos nas águas e até 1920 já estavam estabelecidas em sete estados do Norte (Pará e Amazonas) e Nordeste (Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas).

Na década de 20 os assembleianos ocuparam os demais estados do Norte e Nordeste, e começaram o trabalho nas regiões Sudeste (Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas Gerais) e Sul (Paraná e Rio Grande do Sul).

Em 33 anos de atividades (1911-1944) a Assembléia de Deus já estava instalada em todos os estados brasileiros. A maior prova desse crescimento é que em 1947 o Brasil foi considerado o terceiro país em número de crentes pentecostais do mundo, já com 100 mil fiéis batizados.

A Assembéia de Deus, com apenas dois anos de atividades, mandou um missionário para trabalhos no exterior, cujo nome era José Plácido da Costa para Portugal.

Em 1961 os assembleianos comemoraram o seu Jubileu de Ouro, numa maravilhosa festa no Maracanazinho, Rio de Janeiro, quando esteve presente Daniel Berg, com 77 anos, e Ivan Vingren, filho do já falecido Gunnar Vingren.

 

6.4 EXÉRCITO DA SALVAÇÃO

Em 1865, o pastor metodista William Booth, nascido em Nottingham (Inglaterra), fundou a “Missão Cristã”, juntamente com sua esposa Catherine, com o objetivo de lutar contra a pobreza e o poder do pecado, nome que seria mudado para “Exército da Salvação”, mais tarde.

Booth denunciava os baixos salários pagos pelas fábricas, as condições sociais escandalosas, desmascarava imoralidades, reconciliava famílias e oferecia abrigo, emprego e assistência médica aos necessitados, tudo isso de mãos dadas com a pregação do Evangelho às meretrizes, aos bêbados e aos vagabundos. Era um homem considerado em Londres, médico emérito da Universidade de Oxford, sendo inclusive convidado para a coroação de Eduardo VII. Atualmente, o Exército da Salvação é a instituição beneficente que mais arrecada apoio financeiro no mundo inteiro. 

 

Características 

 

O Exército da Salvação é uma denominação evangélica de estrutura semi-militar, assemelhada à Companhia de Jesus, fundada por Inácio de Loyola (1534). Os soldados são todos os seus membros (homens e mulheres), os sargentos são os obreiros leigos, sendo que os oficiais são os pastores.  A Escola de cadetes é o seu seminário teológico, e as promoções variam de acordo com o tempo de serviço, capacidade e responsabilidade. Seus membros não bebem, não usam narcóticos, entorpecentes, nem participam de divertimentos mundanos. Eles combatem o aborto, a mortalidade infantil, o analfabetismo e a fome, a embriaguez, a prostituição e demais males sociais.  É uma força espiritual dotada de uma consciência social. 

Entre suas obras visíveis, eles abrem centros comunitários, lares para menores e mães solteiras, acampamentos, colônias de férias, casas de apoio, hospitais, maternidades, leprosários, clínicas de apoio a dependentes químicos, agências de empregos e restaurantes populares. 

Uma outra característica dessa instituição é colocar letras religiosas em músicas conhecidas (reggae, jazz, pagode, samba, etc.), utilizando todo tipo de instrumento que se adapte a esses ritmos profanos (pandeiro, bumbo, guitarra, etc). Bater palmas enquanto se canta nunca representou um problema para os salvacionistas.

 

Os pioneiros no Brasil

 

Em 1922 chegou ao Brasil o casal suíço David e Stelle Miche, para tratar  da  instalação  de  uma  extensão  do  Exército  da Salvação  no  Rio de Janeiro, fruto de um pedido do pastor Erasmo Braga a Booth, em Londres.

Esse casal se completava: ela era mais instruída e ele mais piedoso. Nas festividades pela passagem do primeiro centenário da independência brasileira, eles distribuíram 40 mil folhetos que historiava a organização.

Bastaram nove meses para que David Miche tivesse uma idéia do país em que estava. Num relatório a Londres, ele definia o Brasil como uma terra com abundância de minérios e comida, mas quanto ao caráter negativo dos seus habitantes, ele escreveu: povo ignorante, doente, pecador, infeliz; pouco escrúpulo para atingir os objetivos e facilidade para mentir e para apropriar-se do que não é seu; a empregada engana a patroa, o empresário sonega impostos, mais de 80% da população é analfabeta; tendências para jogo a dinheiro, levando muitos ao individamento. Como qualidades, David enxergava que o brasileiro era hospitaleiro, amável e generoso.

Também deve ser destacada a passagem por aqui da missionária norueguesa Helen Londahl. Horrorizando-se com as zonas de meretrício existentes nos grandes centros brasileiros, comandou um grupo de senhoras presbiterianas para organizar uma festa de natal para as prostitutas,constando de gulozeimas, cânticos e pregação da Palavra de Deus.  As prostitutas foram sendo convidadas uma a uma, chegando a um total de 300 convites.  

Para decpção geral, só apareceram quatro convidadas. Mas a festividade foi iniciada como se o salão estivesse cheio, fazendo com que uma das quatro se levantasse chorando. Disposta a abandonar a vida de prostituição, ela foi convidada a morar com Helene até que se ajeitasse numa nova vida. A moça, porém, no dia marcado, não apareceu. 

Em 1938 os salvacionistas inauguraram o “Rancho do Senhor”, também conhecido como o “Lar das Moças”, local afastado do centro urbano que amparava mães solteiras, de modo a impedir que a situação criada as lançasse nas ruas como novas prostitutas. Esse local existe até o dia de hoje, sendo que mais de 1.200 mães já passaram por ali, sendo que algumas dessas moças vieram se tornar membros do Exército da Salvação. 

Charrete de doações


6.5  Igreja do Evangelho Quadrangular

Com exceção da Assembléia de Deus e da Congregação Cristã do Brasil, até a metade do século XX não surgiu mais nenhuma denominação evangélica pentecostal no Brasil, quando surgiram a Igreja do Evangelho Quadrangular (1951), Igreja Pentecostal O Brasil para Cristo (1955) e a Igreja Pentecostal Deus é Anor (1961), todas as três no estado de São Paulo.

 

Origem da denominação

 

Na década de 1920 foi fundada em Los Angeles (EUA) a Igreja Internacional do Evangelho Quadrangular. Esse nome originou-se da interpretação dada por uma mulher canadense (Aimée Semple McPherson)  aos rostos dos quatro seres viventes vistos pelo profeta Ezequiel (Ez 1:5-14), “...rosto de homem, de leão, de boi e de águia”, que simbolizam os quatro ângulos do ministério de Jesus: o que salva, que batiza com o Espírito Santo, que cura e que há de voltar. Ela teve essa visão em 1907, um anos depois do avivamento da Rua Azuza, quando ela tinha apenas 17 anos. 

Depois de cruzar os Estados Unidos pregando a cura divina, de carro, ela estabeleceu-se em Los Angeles (1922), onde passou a pregar o evangelho numa emissora de rádio. Ali, inaugurou o “Angelus Temple”, que viria a se tornar o templo-sede dos quadrangulares de todo o mundo. 

 

Início no Brasil

 

Depois da morte de Aimée (1940), Harold Williams (ex-ator de Hollywood), um discípulo dela trouxe para o Brasil essa instituição (1951). Esse homem primeiro veio para a Bolívia, viajando para o Brasil por rios, terra e mar, desembarcando em Santos (1946), seguindo dali para Poços de Caldas, no sul de Minas Gerais, onde aprenderia a língua portuguesa.

Depois de passar quatro anos quase sem atividades no Brasil, Harold foi para os Estados Unidos, onde permaneceu por um ano.  Aí voltou para o Brasil, passando antes por Cuba, Panamá e Peru, vindo a inaugurar aqui a “Igreja Evangélica do Brasil”, com doutrina quadrangular, mentora da Cruzada Nacional de Evangelização.

Em 1958 a instituição passou a chamar-se “Igreja do Evangelho Quadrangular”, como nos Estados Unidos, quando deslanchou definitivamente, principalmente em São Paulo e no Paraná. Por diversas vezes Harold Williams trouxe ao Brasil um cantor americado de Country Music, chamado Raymond Boatright, que costumava aparecer em filmes como cowboy.  Ele cantava vestido de vaqueiro, tocando a sua guitarra. Enquanto o ex-cowboy cantava, o ex-galã Harold interpretava as falas para o público. Eles iam de cidade em cidade, fazendo uma cruzada em tendas de lona, com capacidade para 1.200 pessoas.

Em muito pouco tempo, mais de 300 brasileiros foram ordenados para o ministério da Igreja Quadrangular, recebendo cada um uma tenda de lona e um sistema de alto-falantes, de modo a iniciar seu próprio ministério itinerante.

Em 1957, depois de fundar o Instituto Teológico Quadrangular, em São Paulo, Harold Williams desentendeu-se com a liderança local, voltando para os Estados Unidos. No seu lugar veio o missionário George Russel Faulkner, que acumularia a supervisão dos campos da Argentina, Uruguai e Chile. Ele permaneceu aqui por 22 anos. 

Faulkner, julgava estagnado o trabalho no Brasil (só 160 igrejas entre o Espírito Santo e Santa Catarina), dinamizou o processo, mandando jovens  obreiros para todas as capitais dos estados não alcançados, sendo que até 1976 a instituição já estava instalada em todo o país. Próximo ao ano 2000 a marca chegou a um total de 6.022 igrejas instaladas (aproximadamente 1,5 milhão de fiéis) com 17.500 obreiros. A Igreja do Evangelho Quadrangular do Brasil sustenta missionários em 15 países.

Quando alguém estranha a quantidade de mulheres entre os obreiros, vale lembrar que foi uma mulher quem teve a visão de fundar esse ministério. Para confirmar essa tendência, lembramos também que as mulheres de Harold Williams e George Faulkner já eram pastoras antes deles.

 

6.6 Igreja Evangélica Pentecostal O Brasil para Cristo

Essa denominação é genuinamente brasileira, fundada pelo pernambucano Manoel de Mello, que morava e trabalhava em São Paulo. De acordo com a maioria dos estudiosos sobre denominações evangélicas, essa é a Igreja pentecostal mais aberta do país.

 

Características 

 

Uma das características peculiares a essa Igreja é um modelo próprio de hierarquia eclesiástica: o diácono está sujeito ao presbítero, e este ao pastor. Deus fala diretamente ao pastor, e esse ao presbítero, e este com o diácono. O presbítero tem ordem para abrir a cortina e falar com o sacerdote (pastor), mas o diácono não pode fazer isso diretamente. 

A igreja O Brasil para Cristo foi a única igreja pentecostal que se aventurou a se filiar ao “Conselho Mundial de Igrejas”, instituição bastante criticada no meio evangélico, pelo fato de reunir ecumenicamente qualquer tipo de credo, debaixo do apoio do FMI – Fundo Monetário Internacional, grupo que comprovadamente apoia o movimento Nova Era. Quando da inauguração do grande templo no Largo da Pompéia (1979), quem pregou foi Philip Potter, secretário do FMI, estando na platéia o arcebispo católico Paulo Evaristo Arns, que foi saudado pelos presentes com a frase: “Eu amo meu irmão católico!”

No ano 2000 a BPC já contava com 600 mil fiéis e 2 mil pastores, a maioria espalhados por São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, possuindo templos na Argentina, Peru, Uruguai. Bolívia, Portugal, Espanha, Dinamarca e Japão.  Vale registrar que a Igreja desligou-se no FMI em 1986.

 

Manoel de Mello – o fundador

 

O pernambucano Manoel de Mello, que morava em São Paulo, exerceu uma série de atividades ligadas à construção civil, enquanto servia a Deus por na Assembléia de Deus e depois na Igreja do Evangelho Quadrangular.

Em 1955, sentiu que Deus o chamava para uma grande obra de avivamento, passando a iniciar um novo trabalho de pregação do evangelho, a chamada Igreja “Evangélica Pentecostal o Brasil para Cristo.”

Manoel de Mello  era  muito  polêmico, fazia  declarações  bombásticas, destemidas, “jogando farpas pra todo lado”. Em 1989, durante o regime militar, pregando numa praça pública na cidade de Tatuí/SP, entre outras coisas, ele disse o seguinte: 

A maioria dos pregadores ensina os crentes a serem fracos, e alguns ensinam até a orar por essas autoridades que estão por aí, baseados no versículo que diz: “Orai pelas autoridades constituídas!”  E eu oro. Só que para autoridade constituída que dirige o povo de acordo com a Palavra de Deus. Quando a autoridade dirige o povo de acordo com a vontade de Satanás, não merece o nosso respeito.

A mensagem que ele pregou naquela noite baseava-se em Ezequiel 37, sobre o vale dos ossos secos.  Segundo registros da própria instituição, a pregação foi tão impactante que 1.018 almas confessaram publicamente a Jesus como Senhor e Salvador, naquela oportunidade, n]ao incluindo aí dezenas de pessoas que não puderam ser cadastradas no momento, devido à grande aglomeração.

Numa outra oportunidade, no Estádio da Fonte Nova em Salvador, ele pregou por cinco dias contra a feitiçaria, sendo ameaçado por milhares de macumbeiros vestidos de branco, com velas nas mãos.

Pelas coisas que dizia, Mello foi preso 27 vezes, acusado de curandeirismo, desrespeito às autoridades, etc. Visitou mais de 130 países do mundo e construiu um templo em São Paulo com mais de 6.000 metros quadrados, incluindo o átrio.

Uma das histórias pitorescas contadas em sua Igreja, está aquela em que o padre Martinho Lutero ao voz de Deus, caiu por terra e foi batizado com o Espírito Santo. Ao se levantar fez o maior roubo do universo: entrou nos aposentos do papa e roubou a Bíblia Sagrada, mandou imprimi-la e começou a cobrir a Alemanha com a Palavra de Deus.  Ainda segundo ele, o papa, muito irado, reuniu mais de 70 cardeais, mas de 1.000 bispos e todo o exército da Itália para dar cabo de Lutero, que não se rendeu às ameaças.


6.7 Igreja Pentecostal Deus é Amor

Essa Igreja foi criada em decorrência das experiências de um rapaz chamado David Miranda, que veio com sua família do Paraná para São Paulo. Católico fervoroso, após um período de divergências com seus familiares, que estavam se convertendo ao Evangelho, ele mesmo teve um encontro do Jesus, sentindo um desejo imenso de criar uma nova instituição evangélica.

Em 1962, sem dinheiro e sem fiéis, solteiro e sem ordenação sacerdotal, ele alugou um salão no bairro de Vila Maria, onde organizou a sua Igreja, pagando o aluguel dos três primeiros meses com a indenização da saída do seu trabalho. Com um mês de funcionamento o trabalho já contava 70 adeptos e ele foi eleito pastor da Igreja.

Em 1975 a Igreja adquiriu um enorme armazém na Baixada do Glicério, comportando 10 mil pessoas, tornando-se a sede nacional da organização, sendo que em 1991 a Igreja já possuía aproximadamente 5.500 templos, mais de 15 mil obreiros, além de missionários em vários países como Paraguai, Uruguai e Argentina.

 

Características 

 

Essa denominação é considerada a mais legalista entre todas as Igrejas  pentecostais. Para se ter idéia, vejamos algumas das suas exigências: as mulheres e os homens sentam-se em alas separadas; homens não podem usar roupas vermelhas; mulheres não podem usar sapatos de salto alto (máximo de 30 cm), anticoncepcional; os fiéis não podem participar de brincadeiras de “Amigo Secreto”; não é permitido estudar Teologia; seus membros não podem se relacionar com membros de outras denominações, pois são consideradas mundanas.

Porém, ao contrário da Assembléia de Deus e da Congregação Cristã do Brasil, denominações também consideradas legalistas, a “Deus é Amor” fez do rádio seu maior meio de comunicação com os incrédulos.

Muitas pessoas enxergam que a Igreja Universal do Reino de Deus copiou uma série de atitudes da “Deus é amor”, como o modismo de utilizar obreiras uniformizadas, a prática de exorcismos escandalosos, onde entrevistavam os demônios, o grito de “Queima! Queima!” para fazer com que os demõnios saiam dos corpos das pessoas, o condicionamento de que a bênção chega à medida em que as ofertas acontecem, etc. Porém, as imitações ficaram por aí, pois a Deus é amor é muito mais amadora e culturalmente ultrapassada do que a Universal.

Há poucos anos atrás a Igreja se viu enredada num grande escândalo financeiro, saída ilegal de divisas para o estrangeiro, em reportagens que desmascararam o luxo e ostentação em que vivem David Miranda, seus filhos e genros, suas mansões tanto aqui como nos Estados Unidos.

 

David Miranda, o fundador

 

Em 1957, David Miranda, católico praticante, foi para São Paulo com sua família em busca de melhores condições de vida, oriundo do Paraná. A irmã mais velha, a mãe e os outros irmãos foram se convertendo em igrejas evangélicas, menos David. Como a mãe quis destruir as imagens de santos que tinha em casa, David chegou a romper relações com a família, preparando a sua saída de casa. Porém, no momento em que ia para casa pegar suas coisas, passou por um local onde se cantava “...a graça de Jesus jamais me faltará...” e ele sentiu um impulso muito grande em entrar naquele lugar. Entrou, sentou, e ouviu o pregador falando sobre o sacrifício de Isaque. Caiu em prantos e rendeu-se ao Senhor, ali mesmo.

Na saída da igreja, ao voltar para casa, ajoelhou-se em plena rua, pediu perdão a Deus pelos seus pecados, prometeu abandonar seus vícios, como o cigarro, jogando fora a carteira que estava no seu bolso. 

Porém, o orgulho não lhe permitiu contar ainda para à sua família o que lhe havia acontecido. Ato contínuo, ele mesmo colocou as imagens de santos num saco e as deixou num terreno baldio próximo de sua casa. Naquela semana, ele assistiu a todos os cultos daquela igreja, sendo que no sábado participou de uma vigília de oração, onde foi batizado com o Espírito Santo.

A partir dali, leu a Bíblia inteira duas vezes seguidas, e sentiu de Deus que participaria de uma grande obra, mas não sabia onde, nem como. A revelação veio com a frase “Deus é amor”, que ele imaginava ser o nome de uma Igreja. Por não encontrá-la é que entendeu que ele mesmo é que deveria  iniciar essa Igreja.

Segundo sua autobiografia, ele sempre foi chamado de “O maior pregador de curas divinas”. Seu nome está gravado em todas as placas externas que identificam a Igreja Pentecostal “Deus é Amor”, tanto nos templo brasileiros como de outros países.

Pr. David Miranda

 

 

6.8 Renovação Carismática Católica

O movimento carismático da Igreja Católica aconteceu num sítio localizado na Pensilvânia (EUA), em 1967, pertencente à diocese de Pittsburg. O derramar do Espírito aconteceu num final de semana, enquanto um grupo de 25 estudantes e dois professores da faculdade local buscavam tal experiência. Eles cantavam hinos gregorianos e faziam orações espontâneas, ao mesmo tempo em que estudavam os quatro primeiros capítulos de Atos dos Apóstolos. As pessoas do grupo estavam habiatuadas a ler livros pentecostais e esperavam pelo batismo com o Espírito Santo.

Naquela experiência de falar línguas e com o avivamento da fé pessoal, houve a preocupação de que as pessoas se debandassem para igrejas pentecostais, com as quais já tinham contatos anteriores. Por isso, firmaram um acordo de que nenhum deles deixaria de ser católico.

 

O movimento chega ao Brasil

 

Em 1970, três anos depois desse acontecimento, Harold Rahm e Eduard Dougherty, missionários jesuítas norte-americanos, trouxeram a renovação carismática para o Brasil, quando retiros alcançaram o mesmo propósito dos universitários da Pensilvânia, começando por Campinas/SP.  

Essas reuniões, passando a ser chamadas de  “Experiências de Oração”, foram se multiplicando pelo país, promovendo o despertamento da vida espiritual de muitos católicos atuantes.

Um anos depois, um padre chamado Jonas Abib abraçou a Renovação Carismática de corpo e alma, sendo que, em 1978, fundou a “Comunidade Canção Nova” com o propósito de evangelizar através do rádio, jornal, TV, livros, CDs, etc.  Em 2000, a comunidade já possuía nove estações de rádio em sete estados e a TV Canção Nova, com 34 retransmissores pelo país. A sede do movimento fica em Cachoeira Paulista, onde trabalham 120 pessoas. 

Após vinte anos de atividade, percebe-se um enfraquecimento no movimento, apesar de, aparentemente, contar com 8 milhões de adeptos e 60 mil grupos de oração. Nem todos os bispos aprovam o movimento carismático, sendo que alguns apenas acompanham, outros respeitam e outros criticam

Além do movimento Canção Nova, ainda existem outros dois, o “Movimento Focolares” e o “Caminho Neocatecumenal”.

 

A visão dos protestantes 

 

A  princípio, as  igrejas  protestantes  vêem  com  simpatia  a   atividade carismática, apreciando a ênfase dada a Jesus, a busca pela leitura Bíblia, a oração, o desejo de louvar, a busca dos dons e do poder do Espírito Santo e o desejo de evangelização, atitudes pouco comuns entre os católicos comuns. 

Porém, as barreiras começam quando os carismáticos reafirmam insistentemente sua crença em Maria como “Mãe de Deus”, “Mãe da Igreja”, “Esposa do Espírito Santo”, etc., práticas contrárias aos ensinos bíblicos. O cardeal Suenens se defende dizendo que “não devemos querer separar o que Deus uniu”, quando se refere à união mística de Maria com o Espírito Santo, para que o Verbo se fizesse carne. São afirmações como essas que deixam os evangélicos pentecostais e não-pentecostais de “cabelo em pé”. 

 

 

7. O MOVIMENTO NEOPENTECOSTAL

 

 

Quando observamos, à luz da gramática da Língua Portuguesa, o nome “Neopentecostalismo”, aprendemos que o seu prefixo NEO (novo) junto ao substantivo PENTECOSTALISMO, referem-se a uma forma ainda mais nova de se praticar o “Pentecostalismo” surgido em 1906.

Consultando o site de Augustus Nicodemus Lopes, vemos que este novo movimento, surgido nos últimos anos, é um desdobramento do pentecostalismo clássico, abandonando algumas ênfases e adquirindo marcas próprias, através de revelações diretas, curas, batalha espiritual, e uma forma sobrenaturalista de encarar a realidade. Ainda segundo esse site, o movimento percebe Deus somente em termos de Sua ação extraordinária, guiando o seguidor na vida diária através de impulsos, sonhos, visões, palavras proféticas, com soluções miraculosas, sendo que tudo sempre acontece através da prática de livramentos, exorcismos e curas. 

Paulo Ayres Mattos, doutor em Teologia pela Drew University of New Jersey, Estados Unidos, e pastor metodista, é mais enfático quando afirma que a era do denominacionismo acabou. Ele considera as atuais denominações evangélicas e pentecostais clássicas como estruturas burocráticas, com discutível poder institucional, muito afastada do crente comum. Segundo ele, para o crente atual, não faz qualquer sentido ser metodista, batista, presbiteriano, assembleiano, ou seja lá o que for. Ele se considera apenas um crente, um evangélico.

Paulo Mattos continua, dizendo que é nesse caldo religioso pós-moderno que crescem as igrejas neopentecostais independentes, onde não prevalece o poder das burocracias eclesiásticas, mas o carisma religioso de seus líderes.

Encerrando, de acordo com os pesquisadores Waldo César (luterano) e Richard Shaul (presbiteriano), pertecentes a igrejas tradicionalmente litúrgicas, “as igrejas históricas devem rever suas formas de culto e experiência religiosa, fazendo uma releitura de sua herança de fé e missão.”

 

7.1  Igreja Universal do Reino de Deus

Edir Macedo e seu cunhado RR Soares eram membros da “Igreja da Nova Vida”, no bairro de Botafogo/RJ, denominação não aberta a costumes e com tendências ao ecumenismo, inclusive com católicos. Essa foi a primeira Igreja a adotar o sistema episcopal no Brasil.

Por motivos pouco conhecidos, Edir Macedo e seu cunhado RR Soares deixaram a denominação para fundar a “Igreja da Bênção” (1977), no bairro da Abolição, Rio de Janeiro, sendo que no ano seguinte o nome foi trocado para Igreja Universal do Reino de Deus.

Pouco depois, os pastores RR Soares e Miguel Ângelo se separaram de Macedo, vindo a fundar, respectivamente, a “Igreja Internacional  da Graça de Deus” e a “Igreja Cristo Vive”.

Com 33 anos de idade, Macedo precisou deixar seu trabalho para poder dedicar todo o seu tempo à denominação, que é totalmente brasileira, a exemplo da “Deus é Amor” e “O Brasil para Cristo”. 

Uma característica desta denominação é a grande e repetida evasão de dirigentes, como RR Soares, Miguel Ângelo, Carlos Magno, Roberto Augusto Lopes, inclusive alguns sendo co-fundadores da instituição. Problemas de entrosamento são os motivos apresentados.

Em 1984, com 17 anos de funcionamento, a IURD já possuía 1.000 templos, 2.700 pastores e um milhão de membros espalhados pelo Brasil, Estados Unidos, Portugal, Angola e quase toda a América Latina.

Além dos templos comprados ou arrendados, a Universal possui uma rede de estações de rádio e televisão, jornais, editora, gráfica, constutora e até um banco. A “Folha Universal” é um jornal quinzenal com uma tiragem de 1,5 milhão de exemplares, transformando-se no maior jornal protestante do país. Os artigos contra os mitos católicos e espiritismo são grosseiros e sem a menor piedade, sem temer represálias. 

 

Características

 

O que mais atrai fiéis à Universal não são as curas, exorcismos, línguas estranhas ou outras características parecidas com outras igrejas, mas a Teologia da Prosperidade, muito utilizada também pela “Igreja Internacional da Graça de Deus”, e pela ADHONEP (Associação de homens de negócios do Evangelho Pleno), uma doutrina de origem norte-americana — Helph and Welth Gospel (Evangelho da Saúde e da Opulência). Isso faz com que a Universal não consiga comunhão com as demais denominações evangélicas por causa dos excessos ligados à prosperidade

Essa doutrina ensina a prática da afirmação positiva, onde se encontram a fé e a oferta em dinheiro, normalmente acima da própria possibilidade do doador, sempre com a promessa de que tudo voltará em quantidade nunca vista antes. Eles ensinam que “Fé é dar o que não se tem.”  

Verdadeiros leilões de oferta são feitos durante as reuniões. Eles criam novidades seguidamente, como trocar dinheiro por “azeite abençoado”, por “areia de Jerusalém”, “bomba milagrosa”, “fitinha do não-sei-o-quê”, etc. Os pastores chegam ao ponto de prometerem orações personalizadas  por  algum tempo para as pessoas que derem mais ofertas. 

Já aconteceu reunião em que as pessoas que tinham recebido oração teriam que passar em fila pelo pastor, tocando a sua gravata. 

O Pastor Elben Lenz César (2000) considera nefasta essa teologia, pois transforma a oferta em instrumento de privilégios materiais e não em gratidão, adoração. Para ele, essa prática deturpa gravemente o verdadeiro culto e o verdadeiro evangelho.

Os anos mostram que essa doutrina têm criado um ninho de  cristãos materialistas e mundanos. A IURD ensina a seus fiéis a não se sujeitarem à miséria, incentiva-os a abrirem seus próprios negócios, etc.  Um comentário na mídia definiu a Universal como “a combinação de uma igreja pentecostal com uma agência de cura divina”, pois une a preocupação nas demandas particulares com a demanda espiritual de salvação. 

Enquanto incentivam a leitura da Bíblia, só incentivam livros editados pela própria denominação, o que lembra um pouco o obscurantismo da Idade Média, quando o conhecimento dos leigos não era incentivado pela Igreja. Também lembra o comportamento da “Congregação Cristã do Brasil”, que só aconselha a aquisição da Bíblia e de hinários. Na IURD pouca ou quase nenhuma mensagem bíblica é pregada, e as que acontecem normalmente mantêm  relações com dinheiro.

Em meio a tudo isso, a “Ceia do Senhor” é servida a todas as pessoas que estiverem presentes, em copinhos de plástico, não importando se são batizadas em águas ou não, ou se pertencem a alguma denominação evangélica. Após a cerimônia, todos devem amarrar os copinhos utilizados, pois estarão “amarrando os pecados”.  

 

Bispo Edir Macedo

 

Ao contrário da maioria dos dirigentes denominacionais que estão na mídia, Edir Macedo tem sido discreto, sendo que pouco se sabe de sua vida privada. Nascido em 1944 no interior do Estado do Rio de janeiro, foi para a capital aos 17 anos de idade para trabalhar numa agência lotérica. Depois de uma pequena passagem pela Umbanda, ele se converteu na “Igreja da Nova Vida”, que fica no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, onde conheceu seu cunhado RR Soares. 

Em 1977 fundou a “Igreja da Bênção” com seu cunhado, que logo passaria a se chamar “Igreja Universal do Reino de Deus.  De 1986 a 1989 ele morou nos Estados Unidos, enquanto sua Igreja era administrada em São Paulo.

Ele começou a ganhar promoção na mídia quando da compra da TV Record e da eleição de três deputados federais e quatro estaduais, época de conhecidos conchavos com Collor e Maluf, procurando sempre repudiar as idéias políticas de esqueda.

Além de pastor, Edir Macedo é um excelente admistrador e empresário, o que explica a natureza “sui generis” da Universal. Não exita em morar em palacetes e ter carros do ano.

Com  uma  certa  arrogância,  Edir  Macedo,  certa  vez,  fez  a seguinte afirmação, para justificar o sucesso da IURD: “Já vivemos a pregação protestante com Lutero, a avivalista com John Wesley e agora temos que sair da mera pregação carismática para a pregação plena.”

Bispo Edir Macedo

 

7.2   Igreja Internacional da Graça de Deus

O nome do fundador da Igreja é Romildo Ribeiro Soares, um capixaba do interior que veio para o Rio de Janeiro em 1924. Na sua mocidade lhe foi oferecida uma bolsa para estudar Medicina numa faculdade de Moscou, mas ele abriu mão desse projeto, para poder se dedicar à obra.

A princípio, RR Soares e seu cunhado Edir Macedo eram membros da “Igreja da Nova Vida”, no bairro de Botafogo/RJ, denominação não aberta a costumes e com tendências ao ecumenismo, inclusive com católicos. 

Ambos deixaram a denominação para fundar a “Igreja da Bênção” (1977), no bairro da Abolição, sendo que no ano seguinte o nome foi trocado para Igreja Universal do Reino de Deus. Em1980 RR Soares sentiu que deveria iniciar o seu próprio trabalho, segundo a visão que Deus lhe dava.

Segundo conta o Missionário RR Soares, certa noite ele sonhou que estava entregando folhetos evangelísticos em uma vila, na qual havia uma loja de artigos de feitiçaria. Dentro do estabelecimento, encontravam-se três mulheres que, ao verem o missionário com os folhetos sobre o Evangelho, correram em sua direção. Porém, Soares não conseguia entregá-los, pois havia uma cerca invisível que os separava. Após várias tentativas, perguntou a Jesus o que fazer, e teve como resposta que deveria jogar os folhetos por baixo da cerca. Fez conforme a orientação e as mulheres pegaram os folhetos. Quando acordou, entendeu imediatamente que Deus queria que ele evangelizasse especificamente nessa, área. Entendeu que mesmo não conseguindo entrar lá, ele alcançaria as almas de algum jeito. 

A primeira “Igreja da Graça” a ser inaugurada foi no município de Duque de Caxias/RJ, seguido de outros lugares como Guadalupe, Parada de Lucas, Terminal Américo Fontenele, São João do Meriti e Niterói.

Seu ministério, entretanto, só começou a ganhar reconhecimento público em 1977, quando iniciou pela antiga Rede Tupi de Televisão um programa diário de TV que funcionou como uma perseguição aos adeptos da feitiçaria.  empos depois Deus proporcionou a oportunidade do seu programa de televisão do Rio de Janeiro também ser transmitido em São Paulo. Em alguns meses, a Igreja da Graça inaugurava sua primeira igreja lá, na Praça da Sé. A partir daquele momento, o ministério se expandiu para o interior do Estado, onde hoje, somado à grande metrópole, já existem mais de 350 locais de pregação.

 

Atualmente, essa denominação mantém um programa de televisão que atinge todo o território nacional, comprando horários de mais de uma rede, inclusive em horário nobre.

As estações de rádio foram mais uma porta aberta para a divulgação do Evangelho. A extinta Rádio Relógio, de alcance nacional, foi comprada e a Nossa Rádio FM, com estações no Rio, São Paulo e Minas Gerais, edificam a vida de milhares de ouvintes por meio das músicas e mensagens de fé. Nesse mesmo pensamento, a Graça Music lançou mais de 70 títulos de Cd´s lançados desde 1999.

Atualmente, a Igreja da Graça possui mais de 1.000 templos espalhados por quase todo o país, Uruguai, Japão, Estados Unidos e Portugal. Além da televisão, existe a revista Graça, livros publicados pela Graça Editorial, fundada em 1983. 

R.R. Soares

 

Características

 

O Missionário Soares, ao fundar a Igreja da Graça, estava apavorado diante do espaço dado pela mídia aos macumbeiros e às obras das trevas, naquela época, sendo que o país caminhava rapidamente em direção ao precipício espiritual. A ousadia dos praticantes da magia negra e a covardia dos pregadores eram tais que, certa vez, um macumbeiro colocou um despacho na porta de uma filial da igreja em que ele era membro. Enquanto aguardava-se o caminhão de lixo para retirar o despacho, o pastor da igreja usou a porta lateral para entrar, pois tinha medo de demônios. 

Apregoando a autoridade concedida ao cristão para expulsar demônios e desfazer toda a obra do diabo, o Missionário RR Soares partiu para um combate espiritual, travado inicialmente na cidade do Rio de Janeiro, utilizando um programa de televisão. Em poucos dias, a cidade toda se apaixonou pela mensagem do programa e as conversões começaram a ocorrer às centenas. Eram pais e mães de santos, junto com seus familiares que vinham entregar-se completamente ao Senhor. Começava o primeiro programa evangelístico da televisão brasileira.

Assemelhando-se aos propósitos da Igreja Universal, a Igreja da Graça também dá um enfoque exagerado às doutrinas da prosperidade e da cura, apesar de dar muita importância à pregação da Palavra de Deus. O missionário viaja todo mês pelo Brasil para realizar campanhas de curas e milagres.

 

8. O JOIO E O TRIGO

 

 

 

Agora, depois de se ver como tudo começou, os pioneiros, os mais diversos ministérios, as mais diferentes formas de evangelizar, perguntamos: Por que tantas denominações se separam umas das outras para iniciar um novo trabalho?  Logo vemos a resposta saltando aos olhos: Muita luta interna, muita busca pelo poder, muita defesa sobre “aquilo que eu penso é melhor”

Quanto às igrejas pentecostais, apesar das muitas buscas pelo poder do Espírito Santo, como se viu desde 1900, é de estranhar que a maioria dos livros editados a partir desse período tenha dado uma tremenda preferência pela terceira pessoa da Trindade, o Espírito Santo, em detrimento de Jesus Cristo, o Salvador, o centro de todas as doutrinas bíblicas, de capa a capa. Boa parte da igrejas pentecostais e principalmente as neopentecostais da atualidade vêm numa busca desenfreada pela cura, expulsão de demônios, prosperidade financeira, etc., o que tem sido motivo de escárnio pela imprensa secular, dada a vulgarização que certas denominações têm dado a essa atividade espiritual. 

Outra coisa importante a ser analisada, é a incansável busca pelos dons do Espírito Santo (línguas, profecias, cura), dando-se menor importância aos frutos do Espírito Santo (amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, etc.) tão enfatizada em Gálatas 5:22,23.

São as Sagradas encrituras quem nos alertam para a presença de joio no meio do trigo, e isso tem sido pouco observado pelos cristãos da atualidade.  É Mateus 13:36-43 quem diz para não esquecermos da constante presença do joio, nem de quem o plantou, ou seja, o inimigo do Filho do Homem. 

É preciso que se diga que nenhuma Igreja está vacinada contra o joio. O joio pentecostal e o joio tradicional estão igualmente representados pela inveja, pelo ciúme, vaidade, sede de poder, endeusamento do homem, mentiras, visões e revelações forçadas, exegeses tendenciosas, escândalos envolvendo dinheiro e sexo, línguas inventadas, coisas ridículas, impurezas doutrinárias, abuso de autoridade, ditaduras eclesiásticas, soberbas sextárias, e mais uma série de disvirtuamentos da Palavra de Deus. 

Elber Lenz César (2000) diz que o verdadeiro avivamento vai muito mais além do passar pelos êxtases e línguas e por visões sobrenaturais; vai muito mais além do vigiar os outros com a Biblia aberta nas línguas originais, de modo a detectar policialmente qualquer pequeno desvio alheio de conduta. 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Este trabalho visou mostrar que o Reino de Deus é composto de uma grande variedade de obras, que as coisas nem sempre aconteceram como as vemos hoje. Muitas das Igrejas tradicionais costumam ser ridicularizadas por causa de certas coisas que defendem tão ardorosamente. Será que os costumes rígidos pregados anteriormente não foram o caminho mais curto para uma conversão segura, numa determinada época? Será que os vestidões defendidos em muitas denominações não respondem mais de perto às orientações bíblicas do que as minissaias e blusas decotadas da atualidade, que muitos defendem comodamente com a alegação de que o que vale é o coração? Esse é apenas um exemplo das diferenças de pensamento entre as Igrejas de outro tempo e as atuais.

Em meio a tantas visões do Reino de Deus, em meio a essa variedade de pregação do Evangelho, é preciso que os pentecostais respeitem mais os históricos, pois foram eles que vieram primeiro, foram eles que abriram as clareira, onde nada havia, encontrando terreno virgem, animais selvagens, índios antropófagos, tudo isso em meio à falta de liberdade religiosa, distâncias quase inatingíveis, falta de transporte, comunicação, para que os crentes atuais possam desfrutar dos recursos da modernidade.   

Muitos deles, talvez, tenham tido uma visão bem mais ampla do Reino de Deus do que muitos de nós, hoje, com toda a liberdade e comodidade que temos, dentro dos belos e confortáveis templos, com ar condicionado, com agua mineral, onde a maioria chega em belos carros, e onde a mensagem é mais facillmente entregue graças aos microfones, câmaras, mouses, etc.

Seria bom lembrarmos que enquanto a Igreja Primitiva levou 30 anos para evangelizar o mundo urbano da época — Jerusalém (55 mil habitantes), Éfeso (300 mil),  Corinto (500 mil), Atenas (250 mil), Roma (500 mil), contando só com Paulo, Pedro, Barnabé, Silas, Timóteo, Lucas e mais alguns, nós, atualmente, gastamos 500 anos para fazer o mesmo só aqui no Brasil, apesar de muita gente ainda não ter sido alcançada.

Por outro lado, vê-se também um sarcasmo das igrejas tradicionais sobre o comportamento despojado dos pentecostais. Consideram mais correto buscar a Deus em cultos frios, mecânicos, do que na “gritaria” dos pentecostais. As Igrejas ficam perdendo tempo olhando e criticando o modus operandi das outras, ao invés de olharem todas juntas para Jesus, o Salvador, verdade que nenhuma delas contesta, na realidade.

Quanto à Igreja Católica Apostólica Romana, o que se viu, neste trabalho, foi que esqueceram a ordem de Jesus em proceder a uma evangelização pessoal, fazer discípulos, batizar em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, conforme está escrito em Mateus 16.  A preocupação do clero sempre esteve centrada apenas em batizar e manter o alto número de fiéis. 

Olhando em todas as direções, precisamos entender que evangelizar não é apenas tirar alguém católico de lá  e trazê-lo para cá, ou convencer irmãos de fé a se batizarem nas águas, ou convencer irmãos de outra denominação que o mais importante é guardar o sábado. Para muitos evangélicos pentecostais, por exemplo, evangelizar ainda é tirar alguém da geladeira e colocá-lo no fogo!

É bom que se diga que quem converte o pecador ouvinte da mensagem da Salvação é Deus, e não a argumentação do evangelizador. Por outro lado, quem anuncia a boa nova da Salvação não é Deus, nem os anjos, mas o homem que já O conhece.

Vejamos agora algumas definições sobre o que significa o verbo Evangelizar e o substantivo Evangelismo:

“Evangelizar é como uma caminhada lenta, normalmente com altos e baixos, até que, finalmente, ela se materialize de forma pública e convincente para todos aqueles que estão à volta.”  (Elbem Lenz César, escritor)

“Evangelismo é compartilhar Cristo a toda e qualquer pessoa com a qual você se encontra, através de palavra falada, livros, folhetos e através de desenhos e pinturas.”  (Joni Eareckson Tada) 

“Evangelismo é proclamar as boas notícias, deixando os resultados absolutamente nas mãos de Deus.”  (Luís Rodrigues, jornalista espanhol)

“Evangelizar é executar o testamento do Cristo ressurreto, cujo centro está em ganhar almas para o Cordeiro.” (Frans Leonard Schalkwijk, missionário holandês) 

“Evangelismo abrange todos os esforços no sentido de declarar as boas novas de Jesus Cristo, com o objetivo de que as pessoas entendam a oferta da Salvação de Deus, tenham fé e tornem-se discípulos.”  (Billy Graham, pregador)

Evangelização é a proclamação das boas novas da Salvação em Jesus Cristo, visando levar a efeito a reconciliação entre o pecador e Deus Pai, mediante o poder regenerador do Espírito Santo.” (Timothy Weber, Doutor em História da Igreja)

Quanto a missões, é preciso que se deixe registrado um dado interessante. De evangelizados, os países da América Latina se transformaram, hoje, em evangelizadores. A tocha da evangelização mundial já esteve nas mãos de Israel, da Europa, da América do Norte, mas agora está nas mãos dos terceiro-mundistas, pois a percentagem de evangélicos abaixo da linha do Equador já é muito maior do que a do Hemisfério Norte. O Brasil, por exemplo, de campo missionário passou a ser uma das novas nações que inverteram o quadro: em vez de receber missionários, envia missionários para todo o mundo. Há quem diga que existem mais missionários brasileiros do que jogadores de futebol em terras estrangeiras.

Na verdade, de uma forma geral está acontecendo uma globalização missionária, pois todos os países, os ricos e os pobres, recebem e mandam missionários. 

 

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AUTOR DA MONTAGEM

Walmir Damiani Corrêa

 

Por: Walmir Damiani Corrêa

Publicado em 15/08/2016

Procedência - Livro: “História da Evangelização do Brasil — dos jesuítas aos neopentecostais”

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